sábado, 19 de dezembro de 2009

Motivos para agradecer

Este ano sou só gratidão. Não sei se aconteceram mesmo tantas coisas boas, mas certamente foi com olhos de alegria e pertencimento que vi este ano. Motivos não faltaram:
- depois de oito anos, minha empresa finalmente deu mostras de que pode não ser uma ONG ou uma instituição sem fins lucrativos. Ainda não estamos praticando a mais-valia, mas a relação custo x benefício melhorou horrores;
- a cautela talvez dissesse para não tocar no assunto, mas como eu e ela não fomos feitas uma para outra, tive um namoro fulminante, enlouquecido, mas fui feliz como nem me lembrava mais que podia ser. Vieram lembranças que eu não lembrava, ficaram outras que vou lembrar. Pronto, falei;
- conheci pelo menos mais dez pessoas novas que não sei se vou ver de novo, mas que poderia ver todo dia ou nunca mais. Não é que tanto faz: é que as pessoas passam e ficam, e é assim mesmo;
- reencontrei outras tantas, me afastei de quem não estava na mesma conexão;
- aprofundei laços e o círculo de mulheres se expande e abraça o mundo e me abraça sempre que preciso;
- ganhei dinheiro fazendo sopa, pessoas se sentiram quentinhas no inverno e eu guardei meu primeiro dinheiro em muitos anos fazendo uma coisa que me dá muito prazer: cozinhar;
- meu quarto de hóspedes foi deliciosamente ocupado por amigos de outros estados e espero continue sendo;
- reformei a sala, meu quintal agora é laranja, tenho uma nova cortina cor de rosa e isso significa que minha casa tem novas luzes insuspeitadas...
E a lista vai embora. Então, eu agradeço!

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Desapego

Cada decepção, uma faxina.
Sapatos para o conserto, roupas doadas.
Lustre daqui para lá, mais luz no escritório, penumbra na sala.
O mofo do muro, expulso: demãos de laranja imperial.
Vaso para a trepadeira, rede sob um caramanchão de alamandas roxas.
Rosinhas vermelhas não cabem em si.
Volta a cortina abóbora, que vai com o edredon novo de flores turquesas e amarelas.
Encho a casa de cores, deserdo meus tons de cinza.
Falta parar de chover.
Falta o céu azul.
Falta.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Que dia...

Desde que o mundo é mundo, as pessoas tentam fazer conexões entre as coisas para tornar a vida mais previsível e evitar o sofrimento. Então se de manhã você acorda morrendo de vontade de chorar, e chora mesmo pra valer, talvez devesse pensar: hoje vai ser foda. Aí você prepara o espírito, ou inventa alguma história para não ir trabalhar. Mas como não é difícil eu acordar chorando, eu que sou de Oxum (ou quero ser), muitos dias seriam foda se essa fosse a conexão.
Deve estar havendo outra conjunção astral hoje. Amigos se desentenderam (e eu no meio), pessoas que resolveriam coisas simplesmente não deram o ar de suas graças, notícias de outras brigas e desentendimentos, doença, erros. Credo! Credo! Credo!
Vou tomar um sorvete e me enfiar debaixo da cama até passar essa zica.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Assim, assado, alhures

Se tem coisa que eu admiro é essa constância das pessoas. Leio blogs em que as pessoas sempre falam do mesmo assunto. E viram especialistas. Escrevem sobre seu tema e postam coisas complementares, mas sempre sobre o mesmo tema.
Puxa, seria incrível.
Mas assim não sei.
Devem ser os múltiplos olhos de Argus da minha borboleta, que não param de olhar para todos os lados.
Já contei que tem uma borboleta chamada Lysandra bellargus, né? Ela é azul-lindíssima por dentro, e por fora tem dezenas de olhinhos escuros. Bellargus se refere a Argus, o monstro de mil olhos da mitologia grega. Que, assim como eu, tudo vê, nada sabe.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Pessoas

Se eu fosse imaginária
Queria ser um heterônimo
De Fernando Pessoa

Seria aquela
que fala de gente
Que vê nas pessoas
o encanto
que Caeiro descobre
nas flores
e nas réstias de sol

Diria
que não acredito
em Deus
porque nunca o vi
Mas que acredito
nas pessoas
que acreditam em Deus
porque as vejo

Eu veria em cada uma
essa essência
que Deus quis que Caeiro
visse nos montes e lagos

E muito provavelmente
– eventualmente –
flertaria com a morte e a tristeza
como Álvaro de Campos

Afinal, a tristeza existe
no coração das pessoas
que vivem intensamente
como as pessoas
de Pessoa

domingo, 15 de novembro de 2009

Elegia

Ressuscitei esses dias um CD do Caetano (Cinema Transcendental) que tem essa música.
Engraçado que esta semana entrevistei o poeta Ferreira Gullar para a revista Casa Claudia Luxo (na próxima edição, quatro materinhas minhas que adorei fazer), responsável pelo Manifesto Neoconcreto.
Os neoconcretos - Helio Oiticica, Lygia Clark, Lygia Pape, Amílcar de Castro e outros - questionavam a matemática e o racionalismo dos concretistas, propondo uma arte que despertasse os sentidos.
Mas é do concretista Augusto de Campos a letra dessa música, uma das melhores definições de mulher que conheço, sensível com um toque impagável de safadeza. Essa mão, hummmmmmm...

Elegia
(Péricles Cavalcanti e Augusto de Campos)

Deixe que minha mão errante adentre
Atrás, na frente, em cima, embaixo
Entre

Minha América, minha terra à vista
Reino de paz se um homem só a conquista

Minha mina preciosa, meu império
Feliz de quem penetre o teu mistério

Liberto-me ficando teu escravo
Onde cai minha mão, meu selo gravo

Nudez total: todo prazer provém do corpo
(Como a alma sem corpo) sem vestes

Como uma encadernação vistosa
Feita para iletrados, a mulher se enfeita
Mas ela é um livro místico e somente
A alguns a que tal graça se consente
É dado lê-la

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Outra lição

A lição de ontem foi um exercício futurológico. Agora a gente teve de escrever para nós mesmos velhinhos. Aí ficou assim:

"Cara eu mesma velhinha,
É engraçado, sabe? Sua imagem para mim é nítida. Cabelos sem tinta. Cachos azulados, talvez, com essas rinsagens antigas. Vai ser bem legal ser uma velha de cabelo roxo. Um pouco mais gordinha, claro. Esses culotes não vão sumir.
Já pensei tanto em você sozinha, numa casa gostosa, cheia de amigos de todas as idades, que é difícil conciliar essa ideia com meus próprios desejos. Porque hoje tenho vontade de ter uma família. Você sabe que filho sem pai não é comigo. Para mim, filhos sempre foram a consequência de um casamento feliz.
Não que eu tenha a ilusão do pra sempre, como eu te disse quando criança. Sei que a vida dá voltas e hoje tenho alguma experiência nisso, para o bem ou para o mal. Mas o começo precisa ser muito bom, você não concorda? Um pouco de segurança, um conforto de saber que ao seu lado há alguém para o que der e vier.
Talvez quando você estiver aí cozinhando e tocando a nossa hospedaria, ou algum outro negócio, você imagine que eu tenha deixado escapar oportunidades. Que no fim a gente daria um jeito. Afinal, foram tantas coisas que fizemos sozinhas, com essa independência que tanto assusta as pessoas.
Me desculpe se você se sente só. Espero sinceramente que ainda dê tempo de encontrar alguém que me faça sentir a segurança de que preciso. Eu já senti isso, você sabe. E confio ainda vou sentir de novo. Torça por nós. Assim, vou poder criar uma nova imagem de você, ainda fazendo um monte de coisas, mas cercada de netos e bichos.

Com carinho,

Eu, hoje"

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Lição de hoje

Hoje era pra fazer uma carta pra gente mesma criança que contivesse as seguintes palavras: vela, guarda-chuva, lentes, um laço e durinha. Eu, muito obediente, fiz do jeito que mandaram, com as palavras na ordem:

"Cara mim mesma pequena,

Se tem uma coisa que você pode ficar tranquila desde já é que palavras não vão lhe faltar. Você não vai ser dessas que precisa acender vela antes de prova. Pode contar com isso. As palavras vêm.
Mas nem sempre na hora que você precisa delas, é claro. Afinal, palavras são que nem guarda-chuva. Por mais que se seja precavido, quando menos se espera ele ficou em casa, todo encolhido, enquanto a chuva desaba lá fora.
Pode contar, então, com a imprevisibilidade das coisas. Assim como não existem fatos, apenas versões, também há sempre lentes que aumentam e diminuem o que seus olhos acham que veem.
Por mais que você tente aprisionar a verdade, é bom que se diga: ela sempre se desfaz como um laço de fita. E pode reparar: mesmo que a gente refaça o laço, ele nunca fica exatamente igual ao outro.
Ah, tem outra coisa importante. Papai Noel existe. Coelhinho da Páscoa também. Mas pra sempre não tem. Não sei quem foi que inventou o pra sempre, mas não vou enganar você: isso não existe mesmo.
Então não precisa ficar sempre assim, durinha. Pode relaxar. Isso. Descansa. Melhor já ir treinando.
A gente se vê,
Você maiorzinha"

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

O tao da espera

Eu não gosto de esperar. Não sei se alguém gosta, mas eu não gosto. Faz duas semanas que eu praticamente não faço outra coisa além de esperar. Me assombro com a minha própria capacidade. Não gritei. Não dei piti ao telefone. Quase nem chorei. Pouco perdi o sono. Até ganhei uma cartela de "boa noite cinderela" de uma amiga insone e nem usei.
Apesar de já estar bem próxima da cura, tanta espera me fez ver que um certo trauma ainda persiste. O mundo me fez assim. Não foi uma nem duas vezes que liguei para saber por que o ser humano estava atrasado e o ser humano não atendeu. Ou tinha esquecido completamente.
Comecei a tentar confirmar antes. Para não correr o risco de ficar pronta na sala esperando e passando fome. Mas não adiantava confirmar de manhã, porque até a hora da história o ser humano podia ter se esquecido de novo. Aí eu precisava ligar/mandar email/smssar mais de uma vez. E fazer papel de louca.
Eu sei que não é o caso. Eu tenho certeza de que não é o caso. Mas além da espera ainda tem o suspense. E essa combinação desafia todo o treinamento zen a que venho me submetendo nos últimos anos.

Coisa de mãe

Minha mãe não é judia, está longe de ser superprotetora. Esses dias a levei ao médico e no caminho saiu um papo de QI. Ela comentou que o QI médio fica entre 95 e 115 e lembrou que eu tinha feito um teste de QI na infância, com uma psicóloga amiga de alguém que precisava treinar.
"Eu me lembro", respondi. "Eu tinha uns sete anos." Minha mãe, que está perdendo a memória, lembrou do resultado do teste, coisa que eu não me lembrava. "Tô acima da média, então, né?", comentei. Sabe o que ela respondeu? "Xi, mas será que ainda vale?"
Depois não sabe porque a gente tem problema de auto-estima.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

O que eu ia ser quando crescer

A maior viagem em termos de "o que eu quero ser quando crescer" foi lá pela quinta ou sexta série, quando achei que queria ser dentista.
Meu primo apareceu em casa nas férias com uma maleta cheia de moldes de aparelho e instrumentos velhos de dentistas. Ele deve ter passado uma semana lá em casa e nesse meio tempo a gente ficou cutucando os moldes, furando cáries e cobrindo de novo com gesso.
Daí que essa brincadeira que talvez tenha mais a ver com escultura do que com odontologia me fez achar que poderia ser dentista. Mas não, né? Isso foi viagem mesmo.

Sonho de infância

Estava lendo no blog Tantos Clichês, que descobri hoje, que a moça sempre quis ser professora, desde pequena.
Eu brincava de professora. Mas minha prima e eu brincávamos mais de banco. A gente tinha um caderno com entradas e saídas e roubava formulários de depósito de todos os bancos possíveis.
Antes de ir para a casa dela nas férias, eu passava em todas as agências bancárias no caminho entre a escola e o ponto de ônibus e pegava os formulários. Quando eu chegava lá no interior, a gente ia na papelaria e comprava DARFs de todas as cores. Aí passávamos as férias todas nos divertindo com a burocracia brasileira.
Não sei quando foi que achei que não levava jeito pra essa coisa de planilhas e administração. Já fui meio relaxada, mas hoje minhas planilhas são um primor.
No fundo, sempre quis mesmo é administrar uma papelaria, cheia de lápis e canetinhas de todas as cores, papeis de carta, pastas, cadernos. Não sei o que seria de mim hoje, com essa oferta insana de produtos chineses. Eu ia pirar!
Sempre gostei de ler e escrever, mas acho que gostava mais de ir na papelaria.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

No Rio

Ontem, Niterói, casas em ruínas, texturas e azulejos portugueses. Muito mais do que uma vista do Rio. Sensação de primeira vez que vi o mar. Sutilezas, apesar de Niemeyer.
Cheiros e sensações hoje no Jardim Botânico. Um primo querido virando a esquina, encontro fortuito sob palmeiras imperiais. Orquídeas, o Cristo sob a neblina, árvores e plantas para inspirar Guillermo del Toro.
A casa do Instituto Moreira Salles, um espanto. Igualdade na tragédia em fotos gigantes (Robert Polidori). Levo poemas de Ana Cristina Cesar.
Dias perfeitos, exceto.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Testemunha ocular da história

Bem, eu estava lá em Noviorque quando caíram as Torres Gêmeas, mas esta é outra história.
Neste momento acabo de voltar da Vila Madalena, no último dia de permissão do cigarro. Fui convocada por uma amiga fumante a acompanhar o último dia de liberdade tabagística e, solidária que sou, fui.
Lua cheia, tempo ótimo. A ideia era ir ao Bar das Empanadas, onde sempre se pôde fumar.
Hoje não. Apesar da lei só entrar em vigor à meia-noite, o bar já tinha colado adesivos e restringido a fumaça muito antes. Na calçada, uma faixa amarela separava os párias fumantes da sociedade sentada em mesinhas e atendida pelos garçons. Não havia a menor chance de conseguir mesa na calçada, especialmente em dia de jogo e quando as aulas não voltaram por conta da gripe suína. Toca procurar outro lugar.
Viramos a esquina e encontramos um bar super miado - 5 pilas de couvert artístico e uma banda que prometia tocar composições próprias (ai...), mas o único lugar que parecia ainda não ter sido contagiado pelo espírito da nova lei.
Dez e pouco chegaram os fiscais do governo, paramentados e munidos de folhetos explicativos. Vieram avisar que estavam avisando, logo podiam multar assim que Cinderela virasse abóbora.
23h12, Didi já tinha fumado um cigarro atrás do outro, e a moça vem confiscar o cinzeiro. "Mas não é só à meia-noite?", replica minha amiga. A moça era fofa, entendeu o momento histórico, deixou a gente acabar a cerveja.
Tirei uma foto da Di curtindo o último cigarro da história em ambiente fechado, enquanto comemorava com ela a última vez que voltava pra casa enfumaçada.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Inspiración porteña

Todo el universo adentro
Y afuera me miro desde lejos
Veo a mi hacia abajo

¿Y qué?

Nada, me parece
A lo mejor
Más tango que samba

quarta-feira, 22 de julho de 2009

No fun

Se, ao acordar, a primeira coisa que lhe vem à cabeça são tópicos da teoria do Mochileiro das Galáxias, você sabe que o dia não vai ser bom.
Lembrei que a humanidade é formada pelos sobreviventes da nave que transportava contadores e secretárias pelo espaço, despachados sem que ninguém se preocupasse onde a nave ia pousar.
Que o sentido da vida é 42.
E que, a qualquer momento, a Terra pode sumir para dar lugar a uma super highway espacial.
E se ao pensar em super highway você ainda se lembra da música dos Engenheiros do Hawai, aí vem a certeza de que o dia, oh, céus, será digno do Marvin.
Nesse dia você acaba tendo de tomar café em pé no posto de gasolina, antes de sair pra fazer uma entrevista com o homem mais mal humorado que o homem mal humorado de Holloway, lá no Jardim Japão.
Ainda bem que eu levei meu CD do Iggy Pop. Entre "Lust for Life" e "Candy" berradas na Marginal Tietê, já fiquei bem mais calma e perdi a vontade de morder a cara do cliente. Deu tudo certo!

terça-feira, 14 de julho de 2009

Não vai ser dessa vez

Lá no Triássico, eu era casada e tinha casa, cama queen size, geladeira prateada, empregada chamada Maria, calha, caixa d'água, vizinhas esclerosadas e duas cachorras. Tudo se enxaixava perfeitamente. Fazia parte de um quebra-cabeças de mil peças chamado família.
Daí a geladeira prateada quebrou, a caixa d'água transbordou, eu me mandei, outra pessoa assumiu a cama queen size e o eventual desentupimento das calhas e as cachorras que eu tanto amava continuaram fazendo parte daquela família, da qual eu não fazia mais parte. Foi como se tivéssemos feito aleluia com as mil peças.
Desde então, sempre penso na hipótese de voltar a ter um bicho. Mas não consigo pensar neles sem todo esse contexto.
Minha amiga ontem me apresentou oficialmente essa gatinha fofa, que eu pensei em chamar de Mirtes (a ideia inicial foi da Maria, e eu adorei). Mas o quebra-cabeças de hoje é daqueles simplinhos, com peças grandes e cartonadas. Não que ele esteja completo, mas essa peça não encaixa.
Acho que não vai ser dessa vez que vou ter um bicho chamado Mirtes. Mas se alguém se interessar, ela vem castrada, vermifugada, prontinha pra fazer parte de um quebra-cabeças em que uma gatinha preta de olhos verdes pode ser justamente a peça que estava faltando.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Do lar

Fico pensando como é que alguém consegue ser poeta vivendo essa vidinha prosaica de hoje. Estava toda imbuída, pensando em amigos mortos, amigos ressuscitados, na mãozinha da minha afilhada me chamando para brincar, em tudo de amor e morte que aconteceu nos últimos dias. Fiz um verso lindo.
Tentava continuar o poema quando a panela começou a espirrar óleo pelo fogão todo, uma sujeira danada. Foi-se embora o verso, na tentativa de minimizar os danos, e só restou essa ideia, esse post sem muita graça.
Mas o atum importado (dolphin free) que comprei na Casa Flora estava uma delícia, e o macarrão ficou ótimo. Acho que meu lugar é mesmo na cozinha...

domingo, 5 de julho de 2009

Meus olhos quando semente de sequoia

Esses dias, um amigo me disse:
— Por favor, toma cuidado...
— Por quê?
— Seus olhos, seus olhos já estão daquele jeito!
— Que jeito?
— Daquele jeito, que a terra não há de comer, porque na hora que eles caírem na terra vão nascer duas sequoias.
Ninguém poderia ter definido melhor. Meus olhos sementes de sequoia exaurem minhas forças, guardam energia para viver trezentos anos, se fixam na terra e lançam raízes.
Se o terreno mais uma vez não for fértil, a semente não brota e ganho mais uma cicatriz. São tantas...

quarta-feira, 24 de junho de 2009

O sábio Chagall

Meu pai me ensinou que não adiantava muito a pessoa ser um gênio se fosse um completo misantropo. Geralmente, a história perdoa a misantropia e até a crueldade dos homens que deixaram seus feitos por aí. Claro que provavelmente muitos não seriam gênios se não tivessem esse lado sombrio, mas lá em casa a gente sempre acreditou que os gênios são mais gênios quando são seres humanos decentes.
Conversando ontem à noite sobre azuis - sim, a cor - lembramos dos azuis de Chagall e hoje cedo fui pegar meu Taschen do gênio russo, precisava ver aqueles azuis. E olha só o que encontrei:
"Como se sabe, um bom homem pode ser um artista.
Mas nunca ninguém poderá tornar-se um verdadeiro artista,
se não for um grande homem e, por conseguinte, também um homem bom."
Marc Chagall

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Sempre tem uma primeira vez

Mesmo quando eu era pequena, nunca fui uma criança muito fantasiosa. Nunca tive amigos imaginários e já tinha uma pontinha de perfeccionismo que não me fazia aproveitar tanto as brincadeiras de faz-de-conta. Uma vez quis montar um circo de cavalinhos que nem o da Emília no meu quintal. Inventamos um monte de atrações, mas achei tudo tosco e não tive coragem de mostrar pra ninguém. Eu devia ter uns 11, 12 anos.
Talvez seja por isso que achei tão rampeira minha primeira ida a um sex shop. Claro que a gente deu boas risadas, mas alguém se excita com aquilo? O lugar já é péssimo. Um piso frio cinza escuro, paredes bege, um biombo de tapume reciclado com as "promoções" penduradas, luz fluorescente. Nas prateleiras, uns pintos tamanho garanhão puro-sangue, nas tonalidades standard e afro, vêm num saco plástico transparente grampeado no papelão com a marca: Rodrigues Produtos Eróticos ou coisa que o valha. Não consegui conferir porque a empresa não tem site. Nem no Geocities.
As embalagens são todas assim: ou um cara de bunda de fora fazendo biquinho e segurando um consolo alargador de ânus ou uma loira peituda americana de cabelo a la Farrah Fawcett mostrando as entranhas. A noção de feminino não passa de rosa-pink furta-cor e o produto mais lúdico que encontrei era um vibrador que parecia um Playmobil com um chapéu de guarda real britânica.
Lembrei de uma lojinha erótica cool que abriu na Vila Madalena há pouco tempo. Tinha lingeries incríveis, versos da Hilda Hilst adesivados nas paredes e brinquedinhos divertidos em embalagens diferentes. Por que será que não durou? Será que é cabeça demais? Ah, vai, um pouquinho de glamour não faz mal a ninguém, fala sério.
Se é pra bagaça ser tosca, acho que a ala de garrafadas e ervas para aumentar a potença que eu vi no mercado Ver-o-Peso de Belém é muito mais legal. Muito mais divertido e lúdico, os rótulos e nomes são muito mais criativos, as embalagens de garrafas de cores e tamanhos diferentes são muito mais estilosas.
Antes um cabra porreta do que o pinto do Rodrigues!

Happy Monday

Poucas coisas são melhores do que chegar em casa na segunda-feira. A casa tá limpa, graças à Santa Luzia, que não cuida dos meus olhos mas deixa minha casa perfeita. Ainda tem uma sopinha feita por mim na geladeira e a salada de frutas mais gourmet do planeta que sobrou de sábado. Sem contar que minha sala nova, elogiadíssima, ficou muito mais aconchegante... E hoje é dia de Private Practice e Grey's Anatomy. Such a perfect evening.

terça-feira, 16 de junho de 2009

Shit happens

Se existe uma coisa libertadora essa coisa é saber que shit happens. Vai dar merda, mais cedo ou mais tarde. Não adianta achar que está tudo bem, então assim há de ficar.
Comigo, especialmente, se está tudo igual eu mesma dou um jeito de ferrar o esquema. O bom é que depois de tanta merda, os insights ficam mais frequentes. Aí você já saca que a merda tá vindo, e às vezes dá tempo de fazer alguma coisa.
Mas nem sempre. Lá estava eu, reclusa, vovozinha, cozinhando feito louca, inventando as sopas mais exóticas e achando tudo ótimo. Aí encontro um amigo, tomo uma cervejinha, bato um papo ótemo, chego bêbada em casa e entro num site de relacionamento.
Pronto.
Estou me divertindo horrores.
Até a próxima merda.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Pelo direito de ser mutante

Acho que a medicina deveria tratar todos os seres humanos como mutantes. Vá lá que ainda não apareceu ninguém azul com escamas, nem com pele de diamantes, sequer com garras nas juntas dos dedos. Apesar de que tem quem me convença a fazer coisas só com o olhar, como a mulher do Wolverine.
O que quero dizer é que os médicos deveriam tratar nossas semelhanças como um acaso e não como ciência. Se eles partissem do princípio de que ter dez dedos é mera coincidência e não o que nos define como seres humanos, quem tem doze dedos ou mesmo nove seria tão normal quanto todo mundo. E não haveria piadinhas imbecis sobre o presidente. Não que ele não mereça certas piadinhas imbecis, mas vamos combinar que fazer piadinha sobre a falta de um dedo do presidente é o que há de mais imbecil no mundo das piadinhas.
Cada vez que vou fazer aqueles exames femininos , todo o ano, mais me convenço de que somos todos únicos, e que aquele monte de médias, estatísticas e limites são convenções que mais atrapalham do que ajudam. Ninguém quer saber de nada da sua vida, vão enfiando coisas, vira pra cá, vira pra lá, de repente você se vê com a cara amassada em uma placa de acrílico, enquanto uma placa de metal gelada faz as vezes de rolo de compressor de desenho animado e transforma seus peitos em uma folha de papel.
Quem dera nossas diferenças fossem tomadas como especialidades que nos definem. Num mundo em que todo mundo precisa ser tão especial para ser alguma coisa, o fato de minhas células se organizarem da forma como são organizadas deveria ser suficiente para que eu fosse eu mesma, mais ninguém. E para que isso, em si, já fosse muito especial.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Eu poderia ter tempo

Se eu não fizesse matéria sobre mesinha.
Se eu não aceitasse assistir os curtas do festival.
Se eu não tivesse que cobrir a festa junina do cliente.
Se eu não participasse de duas reuniões de quatro horas cada uma para um trabalho que vai rolar se pans, mas que a verba é curta.
Se eu continuasse achando minha família um saco e fugindo de todos os compromissos.
Se eu não tivesse decidido transformar meu hobby numa nova fonte de renda.
Se eu não tivesse tantos amigos legais.
Se eu não fizesse tudo o que tenho vontade (que é tudo menos fazer matéria de mesinha).
Eis-me aqui, sobrecarregada de novo.
A diferença é que agora estou feliz.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Um elogio doce

Num dia recente e muito feliz, ouvi um dos melhores elogios que já recebi. Tinha acabado de montar um livrinho com os primeiros poemas da minha safra, primeiros de toda a vida, eu que nunca tinha escrito sequer um batatinha-quando-nasce cover. Com o livrinho na mão, venci uma verdadeira batalha, passei por cima de legiões de soldados da autocrítica, e li um poeminha alto, com o rosto vermelho de vergonha e a voz embargada.
Quando acabei, uma pessoa que estava na sala disse que quando ouviu o poema lhe veio à cabeça a imagem daquela balinha antiga, que tinha desenhinhos no meio, muitas vezes uma florzinha. Eram umas balinhas que vinham em vidro, sempre com as bordas raiadas de verde e rosa e no centro um desenho pequeno. As tais balinhas sempre me intrigaram, porque eram tão lindas e eu nunca soube como se fazia.
Descobri a foto no blog Panela de Cobre, onde o autor menciona que são fabricadas por uma empresa chamada Galo Doce, a mesma que faz aquelas balinhas azedinhas que imitam um gomo de mexerica.
Fala se não é muito fofo parecer essa balinha?

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Chuchu no fio

Na minha rua tinha um chuchu. Sabe-se lá quem foi o incauto que jogou uma semente de chuchu naquele quadradinho de terra da árvore frondosa que protege o ponto de táxi, bem aqui na esquina.
A trepadeira intrépida subiu pelo caule, se enroscou toda na copa e ganhou o fio de alta tensão. Enrolando-se exatamente como o fio se enrola em si mesmo, deu um colorido extra - e algumas folhas - a toda aquela aridez.
Por mais de dois metros de extensão a trepadeira cresceu enrolada e então decidiu dar frutos. Nasceu um chuchu bem no meio do fio, a mais de quatro metros de altura, entre o telhado da pizzaria e o ponto de táxi.
Feliz da vida, o legume vê o mundo de cima, observa os frequentadores do bar em frente e confirma o quanto a voz do povo não se engana. Chuchu dá mesmo em qualquer lugar.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Temporal

O vento latente inquieta. Ainda nem começaram as rajadas e todos já estão eletrificados. As coisas caem sem porquê. A xícara entorna sozinha o café com leite sobre a camisa recém vestida. A vassoura ensaia um voo improvável depois de um chute de leve e derruba o vaso. Os gatos eriçam os pelos e se escondem no fundo dos armários.
As árvores aproveitam para fazer a faxina geral e desprendem as folhas de outono e a galharia seca. As mais antigas, incrustadas de cupins, se acautelam. Foi em outra ventania como essa que a outra caiu, arrastando fios elétricos e arruinando carros.
As pessoas correm sem pressa, só para fugir desse peso suspenso, dessa ânsia espantosa. O clima de iminência é tanto que contagia também a rede elétrica e um transformador explode na minha frente, deixando o bairro todo no escuro.
Aí vem a chuva. Começa com pingos grandes e esparsos, transforma o dia em noite, levanta o cheiro da terra por baixo do asfalto. Alívio provisório. Depois, caos.

domingo, 3 de maio de 2009

Instruções para tomar um ônibus

Caminhe até o ponto de ônibus mais próximo, de preferência em saltos altos e meias-calças cor-da-pele, sob o calor abrasador de uma manhã de verão de São Paulo.
Durante o trajeto, deixe o salto penetrar em um dos inúmeros buracos da calçada, de modo a desgastar-lhe o couro ou a cortiça, sem, contudo, dar-se ao trabalho de quebrá-lo. Bastam algumas imprecações e a dúvida: Volto ou não volto?
O calor é grande, o caminho já vai pelo meio, melhor tocar adiante. Agradeça o fato de a meia ter-se mantido intacta.
Ao chegar ao ponto, torça para haver um assento ou ao menos uma parede em que se apoiar. Em não havendo, alterne o equilíbrio das pernas entre uma e outra, deixando escorrer entre a perna e a meia uma e outra gota furtiva de suor.
Aguarde cerca de meia hora e, ao perscrutar o monstro cor de abóbora que se aproxima, caminhe em direção ao meio-fio acompanhando a multidão que se formou e agarre a bolsa junto ao peito para evitar que lhe seja arrebatada, ou que caia revelando pente, batom, fotos 3 x 4, bilhetes de loteria e afins. Equilibre-se nos degraus até chegar ao cobrador e mais uma vez use o pensamento positivo para que ele tenha troco. Acomode-se entre a axila do sujeito à esquerda e a mochila da Hello Kitty da garota à direita e boa viagem.
Repita a operação cinco vezes por semana, pelo menos duas vezes ao dia.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Reforma ortográfica em versos

Saiu o cisco do zóio
Que se vire o caipira
E o pato passou a fazer quem, quem
Porque trema também não tem

Mia Couto, querido,
Eu pergunto:
Isso te faz meu patrício?

Saramago, meu velho,
É assim
Que se lê o Evangelho?

quarta-feira, 8 de abril de 2009

As piruetas que o mundo dá

Estava dentro do metrô Vila Madalena, perto das catracas, conversando com a minha irmã sobre peças automotivas. Daí vejo o Raí.
- Olha, o Raí.
- Como assim, que Raí?
- O Raí mesmo, irmão do Sócrates. Corpão. Alto, ombros largos, cara mais ou menos.
- Nossa! O Raí anda de metrô? Que legal.
Fiquei vendo o Raí subir a escada rolante e continuei falando sobre autopeças.
- Vixe. Agora estão descendo cinco bailarinas. Muito gordas.
- Ahn? Cê tá bem?
- É! Cinco mulheres bem gordas, de collant e tutu cor-de-rosa.
As cinco passaram na minha frente, colocaram o bilhete e entraram no metrô. Estavam super compenetradas, de cabelo preso em coque e sapatilha, tudo rosa. Desliguei o telefone e passei a catraca também.
Elas estavam dançando na plataforma, dando piruetas e tudo. As pessoas olhavam, entravam no metrô e iam embora.
Fui também, pensando: Pra quê ficção, não é mesmo?

terça-feira, 31 de março de 2009

A arte de rogar pragas

A certa altura do filme holandês "A excêntrica família de Antonia", a protagonista intimida um canalha com uma espingarda, mas em vez de atirar nele, roga a melhor maldição da história do cinema. O homem vai encolhendo, encolhendo e se não foi a praga que pegou, a valentia da mulher serviu para contaminar os outros homens que fizeram o trabalho sujo.
No sábado a gente estava falando sobre isso. Em vez de qualquer xingamento ou até atitude revoltada, melhor desejar uma fortíssima diarréia para o motorista de ônibus que não pára no ponto. Ou para o moleque que finge estar dormindo no banco de idosos.
Tem pessoas, porém, que precisam mesmo é de uma bendição. Tem gente que, para aprender, precisa ser surpreendido por uma boa ação. Caso contrário, vai continuar se fazendo de vítima e achando que o mundo é um carrasco.
Quando pedi demissão de certo emprego, saí de lá desejando que a minha chefe fosse para outra empresa muito melhor e percebesse que é possível tratar os funcionários com mais respeito e peitar a chefia quando necessário. Parece que a praga pegou, só espero que a culpa também tenha feito seu trabalho.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Plofitar é preciso

É só começar criar umas certezinhas novas, pronto, elas logo se plofitam. Tipo um castelo de cartas, que a gente vai construindo e quando acha que vai ficar em pé, cai tudo. Ploft!
O bom é que agora não tá dando tempo de aumentar muito, logo plofita e pronto, ploct, pluft, nhoc... adoro jabuticabas!
E como diria a Leila Diniz vedete do teatro de rebolado, "Oooooooooooba!"

quinta-feira, 19 de março de 2009

Anastácia e Bonifácia

Agora que meu pai tem duas filhas solteiras de novo, voltamos a fazer uns programas que fazíamos na adolescência. Além de irmos para o sítio com eles e às vezes sair para comer, temos feito algumas viagens. Agora estamos combinando de ir de novo para Campos do Jordão, para onde íamos todo ano, os quatro. Na hora de fazer a reserva, é aquela coisa: um quarto conjugado para quatro, ou dois quartos, um com duas camas de solteiro. Fiquei imaginando a pessoa do outro lado da linha, perguntando os nomes das pessoas, e meu pai dizendo: - Sou eu, minha esposa, e minhas filhas Anastácia e Bonifácia. Viajar com os pais nessas alturas do campeonato parece coisa da família da Cinderela...

terça-feira, 10 de março de 2009

Twitter

Eu tenho um twitter, para minhas frases de efeito e engolidinhas rápidas de água.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Cegonha desorientada

Cada vez que faz um calô senegalesco (tks, Van) como o desses dias, mais me convenço de que a pobre cegonha que me trouxe perdeu a rota. Vejam bem, eu tenho uma alma nórdica. Ou pelo menos temperada. E me colocam num corpitcho soteropolitano que come o pão que o diabo amassou cada vez que o termômetro passa dos 30 graus.
Sem contar o mal-estar e a pressão baixa, meus pés hoje ficarão tão molhados que não conseguia andar pela rua e precisei tirar a sandália pra chegar no carro. Nas ladeiras de Perdizes, não conseguia nem parar em pé.
Já me pergunto o que será de mim na menopausa. Melhor realmente começar a pensar em voltar para meu lugar de origem, enquanto o frio ainda existe.

Minha vida no jornal

Há dois ou três anos eu assinava a Folha e tinha várias novas amigas de 20 e poucos anos. Ainda tenho essas amigas, mas agora minhas novas amigas têm todas mais de 50. Assinei o Estadão.

terça-feira, 3 de março de 2009

O cortiço versão classe média

Já faz um tempo que eu queria escrever uma carta para todos os meus vizinhos aqui do predinho. São 16 apartamentos, mas nem todos estavam alugados, então devem ser uns 12 conjuntos de pessoas. E a minha janela, a do apartamento 1, dá exatamente para a calçada em frente. E tem um murinho muito propício a bate-papos de final de tarde e grupinhos de amigos. Acho realmente muito legal quando chego em casa mais cedo e tem vários vizinhos sentados conversando. Mas a maioria dos vizinhos não tem ideia do que eu ouço do meu quarto à noite.
Tem uma vizinha que separou de um cara que tem uma voz de Darth Vader bêbado. Ela tem uma voz ótima e parece estar sempre por cima da carne seca, quando começa a bater boca com o ex- e dizer como ele é um bosta. Mas depois de quase duas horas de quebra-pau, ela sempre chora.
Outro dia parece que ouvi o mesmo Darth Vader discutir um tempão com outro cara, a impressão que deu era que o outro tinha roubado uma garrafa de pinga ou coisa que o valha. Não devia ser o mesmo cara... Mas era mala e sem noção igual.
E tem os que ficam esperando a carona e falando no Nextel. Eu ouço não só a pergunta como a resposta.
De todos eles, os piores são, é claro, os de cima. Um dia vou poder dizer para o menininho que hoje tem uns dois anos e grita como os progenitores: não existe ninguém, além do seu pai e da sua mãe, que saiba mais da sua vida do que eu. Eu não te carreguei no colo, mas ouvi sua concepção.

O fim do término

A TV a cabo acabou, né não? Depois que a Sony começou a passar filmes básicos que já estão na prateleira de dorreal da minha locadora, perdeu tão a graça. Será que os seriados vão acabar? Depois daquela greve de roteiristas, agora só tem reality. Ou o mesmo filme que passou na Globo na hora do almoço do domingo. Afe...
Não tem nada pra ver na TV e a festa do prédio novo tá comendo solta. Mal sabem os novos moradores como eles já incomodaram a vizinhança. Primeiro eram as fofas meninas-placa, que eram coletadas em todas as periferias da cidade e despejadas aqui na frente aos domingos às 7 da manhã. Elas ficavam batendo boca até abrir o mercado, depois comiam e deixavam todo o lixo na porta da vizinha da frente. Duas semanas disso e fui reclamar com os corretores, e ninguém ainda tinha reclamado. Não acreditei.
Daí a obra, aquela delícia. Com essa história de caminhão não poder circular de dia, os caras no final estavam trazendo material de construção no meio da madrugada.
E agora, para coroar com chave de ouro a muralha que se ergueu em frente à minha janela, luzes coloridas e muita música pop, numa festança pra receber essas pessoas que não podiam viver sem quatro garagens. Quem será essa gente?

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Comer, rezar e amar

O best-seller da jornalista americana Elizabeth Gilbert realmente virou best-seller. Até na coluna da Soninha deste mês, na revista Vida Simples, tinha um comentário sobre o livro. Achei a história bacana, mas no fundo o que mais me impressionou foi que a fofa, totalmente desestruturada, conseguiu adiantamento de royalties para viajar um ano pelo mundo e depois escrever um livro.
Outro dia li uma notícia de que as editoras americanas estavam tendo que baixar a bola porque estavam gastando demais em festas de lançamento black-tie. Hahahahaha, essa é boa. Aqui num lançamento bom os caras servem vinho de garrafa azul e amendoim.
Naquele seriado que eu adorava, "Men in trees", a outra fofa também é largada no altar e vai embora pro Alasca pra pensar na vida. A agente literária dela é chiquérrima, mora num apê bacana em NY, e toda hora se abala até o Alasca pra tricotar com a amiga. A escritora, por sua vez, praticamente não faz nada da vida e vive de royalties.
Juro, se inveja matasse era dessa inveja que eu tinha morrido. Inveja de royalties.

Trabalhar mata

Não sou de grandes achaques, mas ultimamente toda hora acho que estou doente. Páro para me examinar, começo pensar no que comi, se alguma coisa pode ter me feito mal, acho que vou ficar resfriada. Aí me lembro: "Ah, não, é que estou trabalhando 12 horas por dia há duas semanas, inclusive fim de semana". Pois é, não é doença, é trabalho demais, de novo, sufoco pra receber, enfim, tudo igual. A única coisa que muda é que as coisas saem, o que antes não acontecia. Mas de resto... adivinha onde vou passar o Carnaval?

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Momento "a velha que em mim habita"

Apesar de hoje eu gostar mais de mim enquanto ser humano do que em qualquer outro momento da minha vida, toda vez que eu saio na balada eu penso que o ápice da mulher é dos 25 aos 28 anos. Que foi o meu, não tenho a menor dúvida. Hoje eu sei que todas aquelas certezas eram muito infantis, mas a vida era tão divertida e promissora!
A maioria das mulheres dessa idade que conheço é assim. Animadas e cheias de planos, ganham grana suficiente para se manter, têm namorados muito legais e a aparência de mulher jovem e cheia de gás. Não são mais menininhas, e por isso são lindas. Já reparou cada mulher linda dessa idade você encontra por aí?
Às vezes, sinto a maior saudade daquela eu, apesar de saber como ela era imatura, e até preconceituosa e cheia de si. E olha que nem gostava de Manoel de Barros, não conhecia os deuses nem Saturno, não tinha ido ao Pará, nem sabia cozinhar.
Não, não é meu aniversário de 60 anos. Mas a distância é tão grande que às vezes parece.

Too old to rock'n'roll and too young to die

Sábado à noite, uma festa rolando, eu aqui traduzindo meu livrinho de criação de filhos e fazendo mais uma experiência culinária com minha nova panela de pedra sabão. É, a idade bateu. Ontem saí pra balada depois de muito, muito tempo e na minha cabeça tocava a música do Jethro Tull. A diferença é que o velho rock'n'roller de cabelo comprido e Harley não tem muita noção de que a juventude passou e eu sei que não é exatamente de velhice meu caso, mas ai...
As pessoas passaram a vida tentando me convencer de que ficar sozinha em casa era bom, de que você precisa de um tempo consigo mesma e eu não acreditava de jeito nenhum. Dizia: Eu? Sozinha? Mas se eu nem me olho no espelho porque não vou com a minha cara, por que é que vou ficar sozinha?
Pois é, mas agora que eu descobri que é bom, me conta: o que é que eu vou fazer na balada? Ficar enfumaçada de cigarro, beber, não ganhar nem uma cantadinha porque a média de idade é 22 anos? Balada não combina com meu novo estilo natureba de ser. Não é que eu esteja reclusa, pelo contrário. Só esta semana saí quatro vezes com amigos, dois almoços, um boteco e uma balada. Mas declinei outras duas. E acabei de me lembrar que já tinha declinado outro convite para hoje por causa do aniversário que estou não indo...
Está muito difícil conciliar os convites com a saúde, o bolso e a minha própria companhia. Sem contar o trabalho e o meu surto atual pela cozinha. Bom, pode ser só uma fase. Mas se continuar, eu já peço desculpas antecipadas pelos canos que virão.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Just a perfect day

Uma hora eu quero fazer tudo e me comprometo com as pessoas, depois percebo que não dá pra preparar uma sopa e ir na balada e chegar cedo para estar em Diadema às 9h30 do dia seguinte. Daí fico em casa, preparo a sopa, não vou na balada, não conheço ninguém e continuo aqui solta na vala.
Fazer um milhão de coisas no mesmo dia só dá certo quando não se planeja nada. Sábado, por exemplo, foi um dos perfect days do jeito que eu gosto.
Fui com a Lu de manhã procurar uma panela de pedra sabão e garimpar coisas de cozinha na Paula Souza. Saímos cedo pra conhecer a rua dos equipamentos de cozinha e foi divertido. Achei a panela, pesada para cacete, linda de morrer.
Daí fomos comprar pão italiano na Padaria Ana Néri, e levei a Lu pra ver onde meu avô conheceu minha avó, fazendo footing no Largo do Cambuci. Na época não devia ter Casas Pernambucanas nem Bradesco, só o açougue do concorrente do meu avô, que minha avó dispensou porque achou que ia dar muito trabalho de lavar aquela roupa suja de sangue.
Aí fomos almoçar num vegetariano e comprar ingredientes no Mercado da Lapa, que eu também não conhecia. Bacana, bom tamanho, achamos coisas boas.
Já era hora, então, de encontrar a Cris pra ir no cinema. Deixei a Lu, peguei a Cris e fomos ver o Gondry. Saindo do cinema, a gente foi correndo até o Parque do Ibirapuera, porque ia ter uma observação da lua na frente do Planetário. O tempo tava ruim, então não dava pra ver, mas fizeram uma simulação lá dentro e pude conhecer as novas instalações depois da reforma. Ficou muito legal. Planetário é tudo de nerd, mas é ótemo!
Depois da apresentação, ainda eram novemeia então deu tempo de tomar uma cervex na Vila com amigos, e acabei voltando pra casa às 3 da matina. Ah, que legal...

Mercúrio retrógrado

Diz a minha gurua astrológica Susan que quando mercúrio está retrógrado, o que quer que isso signifique, a gente aqui na Terra fica à mercê de problemas de comunicação e panes em equipamentos eletrônicos.
A Susan está coberta de razão, não tenho a menor dúvida. Segunda-feira chegamos no escritório e não tinha internet, daí desprogramou todos os ramais do telefone e o fax também. Só no outro dia na hora do almoço é que a gente conseguiu trabalhar. Hoje à tarde caiu uma árvore podre bem em frente ao escritório e levou embora a fiação elétrica e, provavelmente, o cabo da Net. Ruim mesmo foi para o dono do carro que estava ali e ficou totalmente detonado pela árvore. Deve até ter passado na TV, porque um helicóptero ficou ali em cima um tempão.
O engraçado é que em certas épocas alguns seres do passado resolvem rondar novamente sua vida. Dois casos mal resolvidos, um bom e outro mala, ressurgiram das trevas, do nada. Estou atribuindo ao planeta mensageiro. Vou começar a reparar melhor pra já deixar um amuleto contra assombração preparado.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Borboletices

Voltando de Belém me dei ao desfrute de comprar três revistas, das poucas que hoje me interessam. Uma delas é a Bons Fluidos, quem me viu quem me vê. Tava lá a coluna do Rubem Alves, ele falando de borboletas.
O texto me levou de volta ao Mangal das Garças, em Belém, onde tem um borboletário. Dá pra imaginar? Um lugar com vegetação própria, cercado de tela, para que você possa ver de perto várias espécies de borboletas da região, soltas, voejando daqui prali? Só vendo, que graça que é. Tem coisa mais delicada? E sai da lagarta, ninguém se esqueça, que a vida não é só moleza.
Meu nome é borboleta, Lysandra é uma espécie do sul da Europa Ocidental, ali pelo Mediterrâneo. Azul, azul.
Lysandra também foi mulher de Alexandre o Grande, diz a Wikipedia, sobre isso já prefiro não me posicionar. Me disse um professor de grego que o significado do nome é "a que liberta (lys) os homens (andro)". Disso até prefiro esquecer e continuar batendo minhas asinhas por aí.

O que eu vi no Marajó

Na hora em que a gente estava planejando a viagem, eu já sabia que ia adorar a ilha do Marajó. Veja que nome mais lindo. Marajó. Né?
Talvez alguém tivesse me falado de lá, mas não me lembro de nada específico. Tenho a impressão de que nasci sabendo. Sabia dos búfalos, da cerâmica marajoara. Mas não sabia de nada.
Começou com a pousada Casarão da Amazônia, que escolhi pela Internet e era exatamente o que estava imaginando. Novinha, tudo funcionando, piscina ótima, instalada numa casa antiga restaurada. E a melhor surpresa: Dona Rosa.
Dona Rosa trabalhava em casa de família e sempre adorou cozinhar. Contou pra gente que já fez mais de 20 cursos de culinária. Sempre que pode, corre pra Belém e inventa uma moda nova. Dona Rosa chegava na pousada pra preparar o café da manhã e lá ficava, na cozinha, até de noite, inventando biscoitos, treinando receitas.
Com os donos italianos da pousada, aprendeu a fazer macarrão em casa e logo no primeiro dia, depois de uma viagem de barco de três horas que nos deixou um caco, experimentamos a massa que parecia feita pela minha avó. À noite a pousada ainda tinha pizza feita em forno a lenha. Um luxo.
Noutro dia, fomos experimentar o restaurante da dona Dette. Um quintal cheio de árvores, todas elas plantadas pelo marido, seu Antonio. Depois da longa caminhada para chegar até lá, ele nos levou ao ateliê de um escultor local, enquanto a dona Dette preparava nossa carne de búfalo. Além de ter um colesterol baixíssimo, é mais macia que filé mignon. Por cima, uma grossa fatia de queijo do Marajó, branquinho como mussarela de búfala mas mais cremoso. Nham.
Seu Antonio viajou para o sul, conheceu São Paulo, quis abrir os horizontes, ele nos disse. Depois voltou, viu suas plantas crescerem no quintal e fincou raízes. Dona Dette, de Belém, não sai dali por nada. Passamos o almoço vendo revistas e prospectos, fotos dos três filhos do casal, que foram para a universidade em Belém e continuam ligados às tradições da terra.
Teve a Rosangela, figuraça, treinada no verbo turístico. "Isso aqui se faz com dente de jacaré, aquilo com dente de cobra. Quer ver a sucuri que eu tenho no congelador?" Claro que eu quis, adoro cobra. Veio um negócio cinzento e disforme numa gamela de barro. Comprei ali minha tartaruga cheia de histórias e promessas, chacoalhei, deixei na sala, tudo como a Rosangela mandou. O amuleto também tá guardado, "não pode perder nem quebrar". Que las hay, las hay...
E aquela loja de secos e molhados, hoje com quase nada de secos, piso de ladrilho hidráulico antigo? Uma mulher tranquilamente costurando patchwork e louca por um papo. Contou que aquelas xícaras de inspiração inglesa ela não vende, que a fábrica não faz mais. Vem um e pede, ela põe o preço lá em cima. Tem diferença, sabia? Não é qualquer cena azul que vem da Inglaterra. Umas são holandesas, tudo depende. Manja tudo, ela.
Daí teve o passeio na Fazenda São Jerônimo, da dona Jerônima - uma instituição paraense. Foi nessa fazenda que aconteceu aquele programa No Limite, mas isso não tem a menor importância. O que importa é toda aquela família - e seus desdobramentos mineiros e cariocas. Gentes de Soure espalhadas pelo sul, que nos mostraram o guará, o mangue, os caranguejos e até uma carcaça de boto, nossas esperanças à mercê dos urubus na praia. Conhecemos lá o jornalista Celso Fioravanti, um fanático pelo lugar, que passa suas férias na casa da dona Jerônima há 20 anos. Amigo da Neide Rigo, do blog Come-se, o que demonstra mais uma vez a pequenice do mundo.
Soure é isso, Soure está dentro da gente. Mas precisa ir lá pra descobrir.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Recuerdos de Belém

Se mais não houvesse para ver naquela terra, já seria possível escrever páginas sobre as pessoas que conhecemos em Belém do Pará. Não que as pessoas que perguntam "Belém? O que você foi fazer em Belém do Pará?" mereçam algum tipo de explicação, mas vamos começar do começo.
Ano passado fui para a Chapada dos Veadeiros, perto de Brasília, para fugir das praias lotadas e dos destinos tipicamente reveiônicos. Este ano a idéia era a mesma: conhecer algum lugar diferente do Brasil, com uma paisagem incrível, e fora do circuito. Eis que a Gol nos oferece uma passagem a preços acessíveis para Belém. Minha curiosidade já estava mais do que instigada pelas ótimas referências da Elis, da Karina e da Fernanda Sarmento, cada uma com suas experiências com as letras, a música e a arte - uma riqueza que por aqui poucos conhecem.
Lá fomos nós: 4 dias em Belém, 4 em Salinas e 4 na Ilha do Marajó. Paisagens, lugares, animais, vegetação são coisas que não se escreve. Fotos dão idéia mas é só na lembrança que tudo fica e dali não sai. Sem ver não se tem idéia do que é um guará vermelho com o verdume amazônico no fundo. Nem dos pratos, nem dos peixes, como é que se vive sem eles?
Mas de tudo o que mais me encantou foram as pessoas. Gentileza e dignidade. Amor à terra sem patriotada, atenção ao turista sem servilismo.
Pronto, gente, comecei.