quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Primo irmão

Antes as pessoas tinham primos e primos-irmãos. Me disseram que o primo-irmão era o de primeiro grau. Mas não pode ser que seja só isso. Pra ser primo-irmão é preciso ser irmão, muito mais do que ser filho do tio, ou da tia.
Eu tenho um assim. A cada nova conversa, eu falo menos. Ele já entendeu tudo.

Com hora marcada

Meu tempo anda tão contado, faço tanta coisa ao mesmo tempo, que dei pra saber a hora exata em que fico doente.
Anteontem me toquei que estava com dor de garganta às 14h38. Antes do almoço não estava sentindo nada. Voltei, engoli e lá estava a garganta raspando.
Doutra vez, era mais pro final da tarde, mas foi a mesma coisa: de uma hora pra outra me descobri gripada.

domingo, 19 de agosto de 2007

Adolescência demais

Quando falo que hoje há um excesso de alegria, não quero bancar a chata estraga-prazeres. Me refiro também à obsessão pela adolescência, que é outro reflexo do mundo líquido.
Lindo isso que diz Ian McEwan em "Na Praia", seu último livro, que já devorei:
Este ainda era o tempo – que terminaria naquela década célebre – em que ser jovem era um estorvo social, um sinal de irrelevância, uma condição ligeiramente embaraçosa para a qual o casamento era o começo da cura.
Foi nessa época, a década de 1960, que inventaram que era melhor ser forever young. Aí todo mundo lembrou do Peter Pan e decidiu viver na Terra do Nunca. E hoje é um estorvo ser adulto.

terça-feira, 14 de agosto de 2007

A alma e a pena

Sem falsa modéstia, acredito de verdade que minha alma não é pequena. Mas hoje em dia me parece que nem tudo vale a pena. Por causa dessa expressão, dita inadvertidamente, meu ânimo evaporou nos últimos dias.
Faz um tempo que ando questionando coisas no meu trabalho, tão cansada, tanta responsabilidade, tanta cobrança... E eu estava animada com esse projeto, que já faço há anos, todo ano, e sempre me estressa muito. Apesar dos horários malucos, do monte de refações, do desleixo das pessoas, este ano eu estava muito feliz com os resultados.
Até que o rapaz que está trabalhando para mim comentou, depois que eu tinha feito um discurso pra explicar porque que tanta coisa dava errado, sempre: "Bom, se vale a pena..." É onde eu me pergunto: mas vale? Sei não... não é tudo que está valendo a pena, não, viu, Pessoa.

domingo, 5 de agosto de 2007

Homens e hobbies

Conheci um médico que tinha construído um quarto especial em sua casa para abrigar uma coleção de trens elétricos. Radiologista respeitado, tinha até um bonezinho de chefe da estação, várias locomotivas, vagões com os mais diferentes tipos de carga, e passava horas ali, vendo o brinquedo rodar (de boné). Outro que até já citei tem um apartamento com autorama e um videogame desses que você senta e tem uma direção para pilotar.
Minha prima namorou um figura que tinha não só um, mas dois hobbies – construía aeromodelos e tinha um aquário gigante. E para se concentrar mais e melhor naquilo, fumava maconha. Horrores. Conclusão: vivia esquecendo que tinha combinado de encontrá-la. E ela ficava lá no sofá até se encher, então vestia o pijama e ia dormir. Nem um telefonema.
Por que as mulheres não despertam a mesma paixão dos hobbies? Por que nenhum homem (não que eu conheça) esquece da vida explorando, descobrindo, dia após dia, ano após ano, todas as nossas minúcias e todas as nossas contradições?
Tudo o que a gente queria era alguém que prestasse atenção nos nossos detalhes, assim como presta atenção no solo de guitarra, nas jogadas de mestre de futebol. Alguém que conseguisse lembrar de pequenas coisas de que gostamos da mesma forma que lembra de todos os estados dos Estados Unidos (em ordem alfabética), de todas as capitais da Europa, de todos os anos em que o time foi campeão.
Mas não rola, né? Estou mapeando esses impossíveis para parar de sonhar com o que não existe. Funciona.