terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Tietagem ultramarina

Ao que tudo indica tenho muito poucos leitores assíduos, ninguém me perguntou, mas eu digo mesmo assim. Gostei tanto do livro "Sopa de romã" que escrevi um e-mail para a autora, cuja foto achei muito simpática e cuja orelha revelava que a moça é iraniana, criada na Argentina e casada com um irlandês.
Perguntei se ela achava que o molho de romã libanês que comprei prestaria na receita em que ela mandava usar pasta de romã e disse que tinha gostado do livro e tal. Não é que a fofa me respondeu? Além de tranquilizar minha persona cozinheira ainda me contou que a história é uma saga e o segundo livro vai sair logo em português.
Tenho que agradecer a Cris, que me deu a dica do livro. Até já comprei um exemplar pra Lu, que faz aniversário a cada quatro anos. Tenho certeza de que ela também vai adorar. Só não sei se vou dar o presente este ano, porque não tem dia 29 de fevereiro.

Viva a televisão!

Outro dia estava lendo antes de dormir e ouvi um plim-plim da Globo bem alto, num volume semelhante ao das vozes do casal que mora aqui em cima. Na hora, pensei: "Que saco, colocaram uma TV no quarto. Agora vou ficar ouvindo barulho de televisão toda noite antes de dormir."
Cheguei em casa agora e vi a indefectível luzinha azul na janela do andar de cima. E subitamente vi as coisas pelo lado bom: TV no quarto significa sexo zero. Um plim-plim eventual é muito menos invasivo do que o ranger da cama e os gemidos que ouvi há quatro anos, quando eles produziram o moleque que agora grita e faz birra sempre que é contrariado.
Sexo zero, portanto, significa que eles também não vão produzir outro moleque do mesmo naipe. E, muito cá entre nós, evita qualquer tipo de surto inevitável de inveja seguido de pensamentos autodestrutivos, do tipo "se até eles, por que não eu?"

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

24 horas felizes

Tudo começou ontem à noite, quando escrevi um conto muito legal na oficina. Voltei para casa, enchi uma taça de carmenére e continuei a ler o livro meigo que estava lendo. Deparei com uma receita provavelmente deliciosa e fui dormir. Acordei e fiz uma coisa muito rara, continuei a ler o livro, não parei até acabar. Acabou o livrinho adorável, fui trabalhar já assim alterada e com a receita na cabeça.
Consultei uma amiga sobre os ingredientes, como contei antes, fui lá e encontrei todos eles, logo depois de um almoço muito legal com amigas. O trabalho estava tranquilo, pintei as unhas de vermelho, choveu mas não faltou luz e acho que não derrubou a casa de ninguém. Daí entre uma balada de rock passée e as delícias que minha própria casa oferecem, cá estou eu feliz da minha vida. Filminho do Hal Hartley no DVD, Xingu gelada, uma pizza só pra mim e daqui a pouco um chocolatinho da Kopenhagen, que tenho aqui just in case. Ah, daqui a pouco começa Medium na TV. Eis a descrição de uma noite quase perfeita.
Para ser realmente perfeita só faltava mesmo uma banheira. Acho que um dia desses vou levar meus DVDs num motel. Ouvi dizer que a gente pode pedir nossa própria pizza também.
PS.: Mas esse Hal Hartley não é mesmo muito divertido? O moço estava sumido, mas gostei. Adoro essa atriz com sotaque que está sempre nos filmes dele, não consegui encontrar o nome.

Orientalidades

Fazia tempo que não me empolgava tanto com um livro, a ponto de me atrasar para o trabalho para terminar de ler. Até fiz café (com minha nova cafeteira italiana que ganhei de Natal, senscional!), coisa que não faço nunca, só pra poder terminar. O livro é despretrencioso e se chama "Sopa de Romã", de uma iraniana que morou na Argentina e hoje vive na Irlanda. É a história de três irmãs iranianas que fogem para a Inglaterra e depois acabam parando numa cidadezinha do interior da Irlanda, onde abrem um restaurante. Uma coisa meio "Chocolate" meio "Como água para chocolate" (está escrito na capa) ou outros que-tais gastronômicos. No início de cada capítulo, uma receita iraniana. E a tradução é da Nina Horta.
Uma das receitas me deixou intrigada, isso deve ser bom pra cacete, vou fazer. E lógico que hoje vim trabalhar ideiafix e apelei para os conhecimentos exemplares da minha amiga Elis para descobrir onde comprar pasta de romã.
Foi praticamente impossível encontrar qualquer menção no Google. Primeiro, vieram referências a umas pastas suspensas da marca Roma e depois às melhores "pastas di Roma", já que o acento não fez a menor diferença na busca.
Idiossincrasias do Google à parte, a Elis me indicou a loja Maxifour, no Brás. Já tinha comprado pão árabe dessa marca e é muito bom, fiquei toda animadinha. Mais um antro de perdição indicado pela Elis, não bastasse a Casa Flora.
E não é que os caras têm uma filial em Higienópolis? E não é que eu justamente tinha combinado de almoçar no Shopping Higienópolis?
Fui lá e comprei um molho de romã que o moço disse ser o mais indicado para receitas salgadas. Não deve ser a mesma coisa, mas pode ser que sirva. O legal mesmo foi que lá tinha lentilhas vermelhas. Chamam assim, mas são mesmo cor de salmão, algo entre rosa e laranja. Muito, muito lindo! E são escaminhas delicadas, pequenas e fininhas. Ainda não sei o que vou fazer com isso, mas que vai ficar bonito, isso vai.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Lágrimas de Portugal

Dia desses estava com meu pai numa grande loja de jardinagem, comprando mudas de ervas para o meu quintal. Do caixa, ouvi a voz rouca da freguesa que cobrava uma encomenda. Voz de anos de Malboro, certamente alguns scotches. Um pouco inchada talvez, acima do peso. Fechei os olhos para lembrar de onde a conhecia.
Quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal

Minha professora de literatura do cursinho. Ainda estudava letras na época, mas para mim era linda, adulta, mulherão. Os poetas portugueses até então tinham sido uma aula maçante na escola, a professora mais interessada em vender pacotes para a Disney nas férias.
Naquela voz que já se insinuava rouca Pessoa e Florbela eram o que havia de mais lindo.
Naquele tempo de tanta certeza, aquela voz me pincelou de tristeza. Efêmera. Voou para voltar muito tempo depois, reivindicar seu espaço.
Alguém me disse que eu tinha uma tristeza de estimação. Logo se arrependeu, pensou me ofender.
Não, não se ofende quem a conhece e sabe do que ela é capaz. Quando se torna uma velha amiga, sabe que não é senhora de tudo. Conhece seu lugar. Só embaixo do tapete é que apodrece e contamina. Bem cuidada nos leva ao outro lado do Atlântico, nos conecta a Pessoa e Florbela, por teias improváveis de versos.
Linda, minha professora. Não sabia que essa semente já estava plantada até ouvir sua voz rouca entre mudas e vasos. Talvez ela também tenha um quintal...

Coisas de menino

Ainda não fui ver o Clint, mas já tenho um Top One 2010 e vai ser difícil superar. Melhor primeira sequência, melhor filme de menino, melhor filme de monstro, melhor filme sobre solidão, infância, e por aí vai. "Onde vivem os monstros" é tão sensacional que esse post vai sair totalmente vazio e tiete, com adjetivos vagos e bobocas. Muito diferente do filme, que é a adaptação literária mais incrível que já vi.
O grande drama dos filmes adaptados de livros é fazer caber em duas horas o que geralmente renderia uma novela de vários capítulos. Sou bem fã de adaptações de livros, não faço questão de exclusividade em relação à minha imaginação. Mas nesse caso um livro infantil praticamente sem palavras (nem por isso sem conteúdo) se transformou em uma adaptação sensível e profunda, com uma história praticamente igual, mas com um desenvolvimento brilhante.
E o que é aquela primeira sequência? Não tenho ideia de quanto tempo dura, me pareceu que não passou de um minuto - e você já sabe tudo sobre o menino. Quer saber o que é ser menino? Quer saber o que é testosterona? É aquela descida de escada, mais emocionante do que qualquer cena de ação de carro capotando ou mundo acabando.
O que me faz lembrar de dois outros filmes recentes que gostei, mas que me irritaram deveras com esse espírito destrutivo insuportável que a cultura americana cultiva. Primeiro, a animação "UP". Por que será que até um filme em que o mocinho tem 80 anos e o vilão uns 110, se fôssemos exigir um mínimo de coerência, tem que ter destruição em massa? E não é qualquer destruição: são esqueletos e esqueletos de animais pré-históricos colecionados pelo vilão, um museu arqueológico em plena selva amazônica. E parece muito meigo levar a casa de balões até o lugar onde a mulher gostaria de ter ido, mas aquilo não é uma pilha imensa de entulho? Em cima de uma cachoeira sensacional? Tô longe de ser ecochata, mas vamos e venhamos...
O outro filme é "Avatar". Nem vi em 3D, mas fiquei maravilhada com a direção de arte. A história pode ser batida, alguém comparou com Pocahontas. Tem algumas sacadas incríveis, as cores, aquela árvore, lindo. Mas que saco aquele monte de soldados armados até os dentes... Tão chato quanto coberturas da CNN das guerras idiotas que os americanos fazem por aí. Não que não seja realista, claro que é. O filme tem sua lição e tal. O que é muito mala é esse ser o modelo de diversão possível. Se não houver destruição em massa (Deus abençoe a computação gráfica), não é divertido?
Acho que sempre detestei essa coisa de destruir tudo. Até em desenho animado. Deve ser coisa minha, né? Eu é que não entendo esse tipo de menino.

Lepidópteros e coleópteros

Estou aqui numa pesquisa louca sobre a vida da autora Lúcia Machado de Almeida, para escrever um texto biográfico sobre ela para o site de uma editora. Não acho mais do que 20 linhas do mesmo texto, requentado, que pula da publicação dos primeiros textos na adolescência para a morte em 2005. Não tem uma biografia decente.
Puxa, o que seria da minha vida de leitora sem "O caso da borboleta Atíria" e "O escaravelho do diabo"? Imagine, o "Escaravelho" foi escrito em capítulos na revista O Cruzeiro, em 1956! E as "Aventuras de Xisto"? Desde aquela época adoro besouros, borboletas e pastel de queijo.
Tive ainda o privilégio de ter uma prima que trabalhava no Museu de Zoologia da USP, bem nesse período de leituras desenfreadas da coleção Vaga Lume. Ela era responsável por cuidar de coleópteros - ovos, larvas, pupas e adultos. E nas férias eu ia para o trabalho com ela e ficava ali, no porão do Museu, observando aqueles insetos lindos, coloridos.
Não tenho mais os livros, doei para uma biblioteca pública, mas fiquei morrendo de vontade de ler de novo. Obrigada, Lúcia, onde quer que você esteja!