quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

O que eu vi no Marajó

Na hora em que a gente estava planejando a viagem, eu já sabia que ia adorar a ilha do Marajó. Veja que nome mais lindo. Marajó. Né?
Talvez alguém tivesse me falado de lá, mas não me lembro de nada específico. Tenho a impressão de que nasci sabendo. Sabia dos búfalos, da cerâmica marajoara. Mas não sabia de nada.
Começou com a pousada Casarão da Amazônia, que escolhi pela Internet e era exatamente o que estava imaginando. Novinha, tudo funcionando, piscina ótima, instalada numa casa antiga restaurada. E a melhor surpresa: Dona Rosa.
Dona Rosa trabalhava em casa de família e sempre adorou cozinhar. Contou pra gente que já fez mais de 20 cursos de culinária. Sempre que pode, corre pra Belém e inventa uma moda nova. Dona Rosa chegava na pousada pra preparar o café da manhã e lá ficava, na cozinha, até de noite, inventando biscoitos, treinando receitas.
Com os donos italianos da pousada, aprendeu a fazer macarrão em casa e logo no primeiro dia, depois de uma viagem de barco de três horas que nos deixou um caco, experimentamos a massa que parecia feita pela minha avó. À noite a pousada ainda tinha pizza feita em forno a lenha. Um luxo.
Noutro dia, fomos experimentar o restaurante da dona Dette. Um quintal cheio de árvores, todas elas plantadas pelo marido, seu Antonio. Depois da longa caminhada para chegar até lá, ele nos levou ao ateliê de um escultor local, enquanto a dona Dette preparava nossa carne de búfalo. Além de ter um colesterol baixíssimo, é mais macia que filé mignon. Por cima, uma grossa fatia de queijo do Marajó, branquinho como mussarela de búfala mas mais cremoso. Nham.
Seu Antonio viajou para o sul, conheceu São Paulo, quis abrir os horizontes, ele nos disse. Depois voltou, viu suas plantas crescerem no quintal e fincou raízes. Dona Dette, de Belém, não sai dali por nada. Passamos o almoço vendo revistas e prospectos, fotos dos três filhos do casal, que foram para a universidade em Belém e continuam ligados às tradições da terra.
Teve a Rosangela, figuraça, treinada no verbo turístico. "Isso aqui se faz com dente de jacaré, aquilo com dente de cobra. Quer ver a sucuri que eu tenho no congelador?" Claro que eu quis, adoro cobra. Veio um negócio cinzento e disforme numa gamela de barro. Comprei ali minha tartaruga cheia de histórias e promessas, chacoalhei, deixei na sala, tudo como a Rosangela mandou. O amuleto também tá guardado, "não pode perder nem quebrar". Que las hay, las hay...
E aquela loja de secos e molhados, hoje com quase nada de secos, piso de ladrilho hidráulico antigo? Uma mulher tranquilamente costurando patchwork e louca por um papo. Contou que aquelas xícaras de inspiração inglesa ela não vende, que a fábrica não faz mais. Vem um e pede, ela põe o preço lá em cima. Tem diferença, sabia? Não é qualquer cena azul que vem da Inglaterra. Umas são holandesas, tudo depende. Manja tudo, ela.
Daí teve o passeio na Fazenda São Jerônimo, da dona Jerônima - uma instituição paraense. Foi nessa fazenda que aconteceu aquele programa No Limite, mas isso não tem a menor importância. O que importa é toda aquela família - e seus desdobramentos mineiros e cariocas. Gentes de Soure espalhadas pelo sul, que nos mostraram o guará, o mangue, os caranguejos e até uma carcaça de boto, nossas esperanças à mercê dos urubus na praia. Conhecemos lá o jornalista Celso Fioravanti, um fanático pelo lugar, que passa suas férias na casa da dona Jerônima há 20 anos. Amigo da Neide Rigo, do blog Come-se, o que demonstra mais uma vez a pequenice do mundo.
Soure é isso, Soure está dentro da gente. Mas precisa ir lá pra descobrir.

Um comentário:

Anônimo disse...

Fiquei com água na boca. Tá na lista de viagens a fazer logo.

Já reparou como é diferente (muito bom e um tantinho constrangedor) ouvir gente do Norte e do Nordeste? Em comparação com sudestinos, principalmente paulistas e fluminenses, que somos uns ignorantes dessas coisas, eles entendem horrores da própria terra e da própria história.