terça-feira, 22 de novembro de 2011

Não tem mais respeito

Estava revisando semana passada as legendas de um DVD sobre negociação em empresas e um dos palestrantes explica que muitas vezes a negociação dá com os burros n'água porque os dois negociadores perdem a cabeça e acabam partindo para a briga.
Segundo ele, isso acontece por causa do nosso famoso mecanismo de "fight ou flight", ou seja, brigar ou correr, algo que trouxemos de nossos queridos ancestrais da idade da pedra. Tem gente que descendeu do ramo que parte para o pau, e tem gente que veio do ramo que sai correndo. De qualquer forma, é uma reação instintiva e totalmente irracional.
Ele sugere que quando o sangue começar a subir, depois de se ouvir uma proposta indecente, o melhor é respirar fundo e pensar: "Por que essa pessoa à minha frente, um ser racional, coerente e razoável, está me fazendo essa proposta?" No fundo, ele propõe a empatia, se colocar no lugar do outro, tentar imaginar que pode haver razões que meu julgamento imediato não é capaz de entender. E então simplesmente perguntar o porquê das coisas.
Um conselho deveras útil, diante da falta de senso de loção que grassa por aí. Por mais que as pessoas sejam racionais, coerentes e razoáveis, certas abordagens disparam essa reação imbecil imediata e o resultado é uma baixaria total, independente de quem tem razão.
Um exemplo típico aconteceu hoje, embaixo da minha janela. Um rapaz passeava com o cachorro. O bicho fez o que tinha que fazer e o dono simplesmente ignorou e saiu andando. Uma senhora que vinha descendo deu uma bronca no rapaz. Começou a dar sermão, dizendo que o fulano era nojento, que não tinha educação e tudo o que qualquer pessoa de bom senso gostaria de falar para um sem-noção desse naipe.
O problema é que ela o abordou assim, dando bronca, intimidando, xingando. E o resultado foi que o fulano mostrou o pior lado dele: não só respondeu da maneira mais grosseira possível, como ainda soltou uma daquelas frases medonhas: "Sua velha, aposto como não tem marido em casa!" (É ridículo como toda mulher que reclama de alguma coisa é automaticamente tachada de mal comida. Fico besta!)
A reação foi péssima, mas o que aconteceu foi que a senhora supôs que ele era um sujeito idiota, quando na verdade é possível que ele sempre recolha o cocô, e justamente hoje tenha ficado sem nenhum saquinho em casa.
Posso estar sendo Poliana demais, mas isso já me aconteceu. Na verdade, aconteceu de a cachorra não fazer tudo que tinha que fazer na primeira vez e eu estar sem saquinho para recolher a segunda entrega. Fiquei morrendo de vergonha, procurei alguma coisa por perto, um jornal, mas não tinha nada. Nunca mais saí com um saquinho só, mas naquele dia eu poderia ter levado uma esbregue no meio da rua. Certamente eu não teria reagido dessa forma, porque sou da turma do "flight" e não do "fight", mas provavelmente teria me sentido injustiçada. Afinal, eu não sou assim.
Tudo para dizer que não basta estar certo, é preciso abordar o outro com respeito. Mas como diria o Tutubarão, hoje em dia as pessoas "não têm mais respeito"...

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Rogando bendições

Eu já escrevi aqui mesmo sobre a arte de rogar pragas, e acabei tocando de leve em um assunto que muito mais me interessa: a arte de rogar bendições.
Ah, se a bendição pega...
A pessoa que usa desculpas do tipo "eu só estou cumprindo ordens", "mas sempre foi assim" ou "ninguém presta" de repente se vê diante de algo novo e bom... e cai das nuvens! Claro, porque uma pessoa que foi criada numa família em que todo mundo é desconfiado, que sempre pensa mal dos outros, se acostuma a achar que as coisas ruins são assim mesmo e que todo mundo é péssimo até que se prove o contrário.
Então se você trabalha a vida inteira na mesma empresa e é tratado feito gado, você chega à conclusão de que é assim que o mercado de trabalho funciona. E a maioria das pessoas, quando encontra os amigos, não quer nem ouvir falar de trabalho. Quer ir logo enchendo a cara, ou mergulha na novela pra esquecer. Então acaba não tendo mesmo termo de comparação.
Aí uma pessoa dessas vira chefe, e faz com o subalterno o que aprendeu a vida inteira. Se chega alguém querendo mudar alguma coisa, logo acha que o tipo está causando. E faz de tudo pra sabotar qualquer iniciativa, porque afinal de contas... sempre foi assim.
Só que hoje as coisas mudam mesmo, e não dá nem tempo de ver de onde veio a onda.
Por isso, a arte da bendição nunca foi tão importante. Se uma praga do bem pega, a pessoa em questão logo aprende que sim, é possível fazer as coisas de outro jeito, é importante contar histórias novas e ver que aquilo em que você sempre acreditou não é necessariamente o melhor.
Se uma pessoa vem com esse papo para o meu lado, eu costumo dizer: "Eu desejo que você vá trabalhar com pessoas muito, muito, muito legais" ou "Eu desejo que apareça uma pessoa desconhecida na sua vida que te ajude muito". Ah, se pega...
Estava conversando hoje cedo sobre isso com uma pessoa que dá consultorias para empresas, e mais tarde recebi um vídeo que tem tudo a ver, com a palestra de uma escritora nigeriana no TED.
Rogar bendições tem tudo a ver com contar histórias novas sobre o mesmo assunto...

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Mandala virtual











Pintar mandalas no Photoshop também é terapêutico. Faz bem parar no meio de uma revisão, dar um defrag no disco, e voltar à caça homérica ao saci tipográfico.


"A luta contra o erro tipográfico tem algo de homérico. Durante a revisão os erros se escondem, fazem-se positivamente invisíveis. Mas, assim que o livro sai, tornam-se visibilíssimos, verdadeiros sacis a nos botar a língua em todas as páginas. Trata-se de um mistério que a ciência ainda não conseguiu decifrar." Monteiro Lobato

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Pintando mandalas

Se alguém me liga à noite ultimamente e pergunta o que estou fazendo, a resposta invariavelmente será: "estou pintando mandalas". Depois que ganhei da Cassia dois livrinhos com desenhos de mandalas para pintar, descobrir que finalmente tenho um hobby.
É uma delícia isso!
Não conhecia nenhuma teoria a respeito das benesses de pintar mandalas, mas na prática estou descobrindo que é um exercício de meditação e realmente ajuda a colocar os pensamentos em ordem. Como as mandalas geralmente são simétricas e têm regiões delimitadas, você aos poucos vai escolhendo as cores e pintando, área por área, até ter o desenho todo colorido. No começo, você só enxerga o desenho a traço, o macro. Conforme vai pintando, vai enxergando as microrregiões que formam o desenho e quando termina, às vezes apareceu outro desenho. A sensação que eu tenho é como se meu cérebro fosse o cubo mágico e eu realmente soubesse como montar.
Fui pesquisar o assunto e descobri que é uma terapia reconhecida mesmo. Na Internet tem vários sites com desenhos para imprimir em casa e pintar. Recomendo.
Estou tão feliz pintando meus desenhos que depois de ter colorido várias com meu jogo de canetinhas de R$ 3,99 e com os lápis de cor que vieram no super estojo que comprei outro dia, resolvi ir hoje ao Kalunga especialmente para comprar novas cores de lápis de cor. Adquiri um maravilhoso estojo de 48 cores, com 24 lápis bicolores. Veja que ecológico e que econômico, cada lado do lápis tem uma cor.
A única frustração é que os nomes das cores mudaram. Na minha época, eram mais poéticos. Jamais me esquecerei do Verde da Prússia, cor de um lindo Fusca que meu pai comprou em 1978. Até hoje, uma das minhas cores favoritas. Nesse novo estojo, o mais parecido é o Verde Turquesa.
E o que dizer do Verde Berilo, um verde claro azulado que hoje corresponde a um prosaico Verde Água? Tsc, tsc, tsc...
Tudo bem, tem um dourado e um prateado, vai. Mas que as nossas cores eram mais bonitas, lá isso eram. Ainda mais porque não era todo dia que se podia adquirir um estojo dessa envergadura. Só existia o de 36 cores e era um presente de Natal!
Enfim, nostalgias à parte, já estou testando e o resultado tem sido bastante satisfatório. Independentemente das 48 novas cores, o processo realmente é ótimo.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Limites

Trabalhei uma vez em um evento médico, organizado pela minha irmã, coordenando as recepcionistas das salas de aula. Resolvi ficar para ver uma aula de neurorradiologia e foi muito legal quando o médico mostrou uma figura didática de um cérebro humano, com as subdivisões por área funcional. Em azul claro, digamos, a memória. Em vermelho, a fala; em verde, as funções motoras. E por aí vai.
Aí, disse ele, é assim que a gente aprende na faculdade. Mas quando chega a hora de abrir uma cabeça no centro cirúrgico, o que a gente vê é bem diferente.
E então ele mostrou uma imagem do cérebro real, dentro de uma cabeça aberta, de um paciente na sala de cirurgia. Tudo vermelho. Sem nenhuma demarcação entre uma função e outra. É aí que entram os exames de imagem, ele explicou, para tentar prever que área pode ser afetada na cirurgia, e se pode haver alguma sequela inesperada.
Lembrei disso hoje, voando de São Paulo para João Pessoa. De cima, via cidades, morros, paisagens, pequenos bosques, plantações. Nenhum limite geográfico, nenhuma fronteira entre municípios. Sobrevoei uma meia dúzia de estados, pelo menos, e não vi linhas demarcatórias. Só uma continuidade das paisagens mais diversas, morros escuros, pedregosos, estradas de terra, concentrações de mata em vales de rio.
Que coisa, né? O mundo não é um mapa. As fronteiras geográficas talvez sejam ainda mais arbitrárias do que as regiões funcionais do cérebro.
Por isso é que sempre gostei mais de viajar do que de aulas de geografia.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

I need space

Hoje a depiladora me disse que foi à 25 de março e voltou correndo, sem comprar nada, porque não aguentou o tanto de gente.
Lembrei na hora de um episódio muito divertido da série Creature Comforts, do Nick Park, que sempre me faz morrer de rir. Essa série de animação mostra animais sendo "entrevistados" nas mais diversas situações. Nesse episódio, o entrevistador (que nunca aparece) está no zoológico de Londres e vai indo de jaula em jaula até chegar à onça.
É hilário: a onça tem sotaque brasileiro e gesticula como nós. Ela começa dizendo que é bem tratada, que tem comida, mas que precisa de espaço. Que lá é frio e apertado, apesar de ser tudo muito tecnológico.
Se a pobre onça morasse em São Paulo, talvez continuasse tendo a mesma sensação. Tem cada vez mais gente, as pessoas ocupam todos os espaços, moram em apartamentos cada vez menores. E vários lugares estão parecendo a 25 de março, uma muvuca insana. Eu não vou lá nem que me paguem, porque realmente me identifico muito com essa onça.
Outro dia passei cinco dias trabalhando no sítio, que na verdade é um terreno grandinho mas está longe de fazer jus ao nome. Mas tem uma casa, um pomar, um campo de futebol. Não sou de abraçar árvores, sou bem urbanoide, levei vários filmes, computador. Mas fazia muito tempo que não me sentia tão bem em um espaço. Porque podia ir de um cômodo para o outro e ficar em silêncio. E estar só.
Sempre achei difícil ficar longe das pessoas, morria de tédio nas férias, queria sempre estar fazendo coisas. Mas só hoje me dou conta de que, por morar em uma casa espaçosa, sem perceber desfrutava dessa solidão, do silêncio, fazendo o que mais gostava: ler. Hoje moro em um apartamento que não é pequeno para os padrões atuais. Mas ouço cada vizinho que entra e sai, gritos da louca do andar de cima, ônibus passando, o caminhão de lixo reciclável do Pão de Açúcar. Sinto também o cheiro do cigarro da zeladora enquanto ela lava a calçada.
E às vezes me lembro da onça, e falo para mim mesma "I need space"...

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Conflito de gerações

Pesquisando para uma matéria sobre as diferentes gerações que estão no mercado de trabalho, encontrei artigos que explicam todo esse babado de Geração X, Y, Z e o escambau. Nunca antes na história deste capitalismo selvagem cinco gerações diferentes conviveram no mercado de trabalho.
De cara, já dá a impressão de que nunca os intervalos entre as gerações foram tão curtos. Hoje temos pessoas de 70 anos trabalhando com outras de 18, e não é de se espantar que as visões de mundo sejam tão diferentes. Uns nasceram pouco depois da invenção do raio X, enquanto outros foram esquadrinhados antes de nascer por pelo menos cinco exames de ultrassom e graças a isso seu quarto já era azul ou rosa meses antes do parto (acho que isso não mudou, que pena).
Muita gente reclama da Geração Y, que dizem ser mais comprometida com suas próprias vontades do que com as empresas. Bom, pelo menos alguém está começando a ficar esperto, né? Em um texto que traduzi recentemente, um consultor americano de RH dizia, sobre essa postura da Geração Y, que isso acontece porque um motivo muito simples: as empresas falharam com seus funcionários em momentos difíceis. "Hoje, as relações de trabalho são muito mais transacionais, e as pessoas se preocupam com sua carreira. Os funcionários querem desenvolver habilidades que os tornem 'portáteis'; ou seja, não vão se interessar para aprender aquilo que só seja aplicável à empresa para a qual trabalham."
Não é óbvio ululante?
Tenho pra mim que apesar de ter nascido na Geração X, já sou algo como um Y bemol. Tem certos sapos que nunca engoli...
Mas tudo isso me fez pensar mesmo em várias mulheres profissionais que conheço na casa dos 50 e poucos anos. Tenho amigas e pessoas com quem trabalho nessa faixa etária, e acho que são as que mais estão sofrendo com as mudanças.
Porque essa geração de mulheres foi a primeira no Brasil que teve a oportunidade de se dedicar à carreira. Foi a primeira geração que não teve a família como primeira opção. Para conseguirem sobreviver, tiveram de adotar as "táticas" do mundo em ação, o jeito masculino de se impor no grito se necessário. Às vezes autoritárias, às vezes complacentes, superprotetoras. Mães como provavelmente foram as mães delas. Admiro muito mesmo essas mulheres e agradeço o caminho que foi aberto para as gerações seguintes. Hoje, se temos escolha, devemos a essas guerreiras.
Mas antes que adoeçam, antes que se tornem mais uma estatística de doenças que antes só acometiam os homens, está na hora de procurar um respiro. De tentar entender que a nova geração, por mais individualista que possa parecer, tem muito de autopreservação a ensinar. E, vamos combinar, um mundo menos hierárquico não seria muito mais humano?

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Felicidades e felicidades

Eu sou assim, digamos, uma Poliana sarcástica. Cínica não, que o cinismo abandonei junto com o ex-marido e o jornalismo. Mas sarcástica sim. E Poliana.
Ontem chegou minha encomenda da FNAC. Tinha um montão de pontos acumulados e quando é "de grátis", mesmo não sendo, você fica mais permissiva. Comprei dois CDs de novas mulheres cantoras adoráveis, brasileiras. Sim, eu sou dessas loucas que ainda compram CDs, e sim, essa mídia ainda existe.
Enfim.
Abri o pacote, e além dos dois CDs, três livros. Dois escritos por mulheres. Os dois com algo de felicidade no título. Um poliânico, um sarcástico. Reparei só quando vi os dois lado a lado, na mesa da cozinha. Um, o poliânico, é a nova coletânea de crônicas da Martha Medeiros, "Feliz por nada". Ela escreve aos domingos no Globo e gosto tanto dessas crônicas, são sempre tão equilibradas e bem resolvidas. Já peguei, comecei a ler, engatei duas ou três, quero ser do contra e não consigo, não é autoajuda, é simples, mas é profundo, me deixa contente, porque é pé no chão, não é rosa pink, é um rosa mais pálido e seco, é seda, não é tafetá. Gosto, isso, gosto e me identifico.
O outro é "Felicidade demais", de contos da canadense Alice Munro. Pelo título já se vê, poliânico não é. E o primeiro conto... já é uma paulada. Essas escritoras canadenses, viu? Que percepção. Margaret Atwood é outra, pelamor. É tão agudo, dói no fígado. São histórias de mulheres, pelo visto, personagens construídas com uma observação incomum, de alguém que sabe calçar os sapatos alheios. E você pensa: não é possível, isso não é inventado; ela deve ter conhecido alguém assim.
Eu, por exemplo, já me senti assim:
"Ela devia ter percebido, e naquele momento, mesmo que ele ainda estivesse longe de perceber. Ele estava ficando apaixonado.
Ficando. Sugeria um período de tempo, um deslizar para dentro. Mas se poderia pensar numa aceleração, um momento ou o segundo exato da queda. Agora Jon não está apaixonado por Edie. Tique. Agora está. Era impossível de conceber como provável ou possível, a não ser que se pense em termos de um tiro no meio da testa, uma calamidade súbita. O golpe fatal que aleija um homem, a brincadeira maldita que transforma olhos claros em pedras cegas."
Que felicidade se reconhecer em personagem de livro bom...

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Eu quero sonhar com monstros

Passei o domingo com a minha afilhada de 5 anos, que está cada dia mais figura. A garota tem um mundo interno rico e peculiar como o do tio e padrinho dela, meu primo André. E uma tagarelice igual à da Dinda dela (eu, claro).
Deu de me contar pesadelos. Voltávamos do lançamento do livro "Canteiros", que tem arte da minha amiga designer Roberta Asse, publicado pela Ática. Lindo livro, com músicas, atividades e poemas, um encanto. Difícil ver uma editora investindo em obras assim por aqui, valeu, Claudinha, a gente adorou!
Íamos de carro, de Higienópolis para o Brooklin, o que, mesmo no domingo, é tempo para botar todo o papo em dia. No sonho dela tinha uma nuvem maligna no banheiro. Com o correr da contação, acabou que era tudo muito engraçado e foi ela mesma quem se deu conta. Chegamos à conclusão de que não era pesadelo coisa nenhuma e morremos de rir.
Ontem resolvi anotar nossa conversa, pra não perder o espírito da coisa, e continuei no papo pesadelo. Ao mesmo tempo, um conflito de agendas e uma apreensão, negocia daqui, muda a reunião, vou viajar para um cliente, o outro acha que estou à inteira disposição.
Conclusão: tenho um pesadelo à noite, acordo assustada achando que perdi o voo, estou atrasada, nem fiz a mala e já é hora de embarcar.
Pra que, inconsciente, me diz? Qual a finalidade desse pesadelo? Que coisa mais enfadonha! Estavam lá meu pai, minha mãe, meu quarto, tudo igual. Nenhuma parede escorrendo, meu pai não era um centauro, nenhum ser com duas boquinhas, como sugeriu minha afilhada na nossa conversa de domingo, propondo uma simetria que, para ela, seria "muito bonitinha".
Nem sei quanto tempo faz que não sonho com monstros, nem com nada que não seja estritamente real. Claro, às vezes junto duas pessoas que não têm nada a ver, mas não passa muito disso. Tenho bem poucos pesadelos, mas quando tenho são essas inutilidades da vida prática. Hello, inconsciente, eu jamais vou perder um voo pra João Pessoa!

terça-feira, 19 de julho de 2011

E o que não está aqui...

... está no outro blog que inventei, pra escrever sobre comidas. Afinal, sou dramática mas sei que a vida é sopa!

Está tudo aqui

Ressuscitando umas coisas do caderno de poesias, ressuscitando esse blog espasmódico... Hoje reunimos o grupo literário depois de quase um mês, os encontros vão e voltam. E eis que no meio das conversas telefona um colega em licença desde o começo do ano, mal sabia, tô na esquina, tô indo.
Que máximo! Fazia tempo que não escrevia nada, recuperei então algumas coisas do ano passado.

Dizer que o universo é escuro é limitar-se aos cinco sentidos. É esquecer que a imaginação já chegou ao infinito, viajou pelas galáxias, enfrentou chuva de meteoros. Dizer que o universo é escuro é matar a golpes de alfinete o elefante cor-de-rosa que ganhei de você.

Janelas da alma

Não foi cebola, nem novela
Nem carta de amor, nem conjuntivite
Não foi surra, nem humilhação
Foi de feliz, ela jura

De uma felicidade sem mais, uma bênção
Bateu uma brisa, levantou-lhe a saia
Um pio de corruíra, um arrepio na nuca
um jorro

Chorou de existir-se

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Trenzando hilos

Dias felizes são dias de encontro. Dias de ciclos que se fecham. Dias de coincidências impossíveis.
Hoje foi um dia feliz.
O encontro era sobre isso. E naquele quintal, o fechamento do ciclo que começou dia 1 de fevereiro, quando cheguei a Buenos Aires. Nesse período, estudei roteiro, mergulhei na linguagem das imagens, estudei a arte contemporânea de mulheres, me maravilhei com os trabalhos e o grupo de mulheres que participou dos encontros, dei de cara com o projeto Yo no Fui, que oferece oficinas de poesia no presídio feminino de Ezeiza.
Hoje na hora do almoço fui me encontrar com uma das poetas responsáveis pela oficina. Depois de me contar como funciona o projeto e de conversarmos bastante, ela me convidou para um encontro de poesia e música na galeria de arte Dabbah Torrejón. Ela e uma das meninas do projeto tiveram a chance de expor e vender as coisas feitas nos ateliês de trabalhos manuais do projeto, de serigrafia e costura.
O sarau foi organizado pelo grupo que faz o site Muchos Días Felices. As pessoas entram e mandam fotos e textos contando seus dias felizes. E eventualmente se reúnem em carne e osso para ler os textos em público.
Logo depois que cheguei, entrou Marta Minujín, uma das artistas que estudamos no curso e que estava com uma exposição individual gigante no Malba até semana passada. Martha esteve no centro da contracultura em Nova York na década de 60 para 70. Fez um trabalho genial na década de 80, quando levou para o meio da rua em Nova York um carregamento de espigas de milho — o ouro latino-americano — para trocar com Andy Warhol pela dívida externa dos países da América Latina. Depois, tentou resolver o problema das Malvinas entregando milho a Margareth Thatcher.
Estava lá, a Marta. Roupa toda preta, cabelo absolutamente branco de franjinha, vários anéis e pulseiras e o indefectível Ray Ban espelhado que é sua marca registrada.
Os fios soltos da arte, do cinema, da poesia, trançados.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Por uma balança comercial Brasil x Argentina mais equilibrada

Logo que cheguei aqui, nossa nova presidente estava na área. A primeira viagem oficial de Dilma foi essa visita a Cristina Kirchner. Quem diria que um dia veríamos os dois maiores países da América do Sul com presidentes mulheres. Realmente, críticas a parte, eu fico feliz.
Mas voltemos às relações comerciais Brasil x Argentina. Um dos temas das conversas das duas excelências foi o desequilíbrio da balança comercial em favor do Brasil. Claro, a indústria argentina parou no tempo e agora a maioria dos produtos são importados. Não só do Brasil, mas muito da China. As vitrines da Ave. Santa Fe não me deixam mentir.
Tendo em vista o incremento nas relações bilaterais entre os dois países, apresento a seguir algumas sugestões de produtos alimentícios que podem ajudar melhorar o equilíbrio da balança comercial em favor da Argentina.
- Manteiga La Serenisima - tem um gosto bom e não fica uma pedra na geladeira. Dá pra passar no biscoito em seguida, sem espatifar.
- Tomate pelado Salsati La Campagnola - muito melhor do que vários italianos que já comi. Não tem casca mesmo e os tomates são mais vermelhinhos, fica pronto mais rápido e é mais saboroso.
- Grão de bico em lata La Campagnola - o cheiro já é mais intenso do o Bonduelle, que também é bom mas custa caro. Deve ser ótimo para fazer homus, mas como não tenho apetrechos não pude experimentar.
- Alfajores Cachafaz ou Abuela Goye - o primeiro é vendido em qualquer kiosko, o segundo só tem uma loja na Galeria Pacífico e outra na Florida, porque é original da Patagônia. A grande vantagem, para mim, é que são de chocolate meio amargo e bom. O Abuela Goye, vejam vocês, já existe num shopping chiquérrimo de Salvador, mas sou favorável a incentivos fiscais para a instalação da rede em São Paulo.
- A carne... Ah, isso todo mundo já sabe. Nesse caso, sou favorável à aquisição de matrizes argentinas ou de reprodutores de altíssima estirpe para uma substituição lenta e gradual do nosso rebanho zebu pelos angus locais. Tudo bem, corremos o risco de ver o preço do cupim ir às alturas, mas acho que é um risco a se correr.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Giardino dei Taiocchi

Um dia achei que sabia história da arte. Estudei duas vezes, no colégio e na faculdade de design. Li muita coisa também. Mas cursos genéricos de história da arte são como as aulas escolares de história: o programa sempre atrasa e nunca se chega aos dias atuais.
Esse sempre foi um assunto que me fascinou. Em um momento da minha vida achei que precisava explorar uma forma diferente de expressão, manual, plástica, pois nem me passava pela cabeça que escrever pudesse ser uma expressão criativa para mim. No fim, deixei pra lá.
Até agora, não consegui liberar o cisne negro que existe em mim e confesso que talvez gostasse de ter a experiência visceral da personagem do filme (assisti ao filme ontem, ainda estou processando).
Enquanto isso não acontece, vou levando com o racional mesmo, que apesar de complicar minha vida de várias maneiras e de me manter a uma distância pouco saudável do meu corpo, é o que se pode arrumar no momento. Pelo menos hoje sei que escrever é minha forma de expressão, e o que sai vai além das matérias jornalísticas.
Mas se não posso fazer artes plásticas, estudo.
Já disse que não resisti e me matriculei em um curso sobre mulheres artistas contemporâneas. Estou conhecendo trabalhos sobre os quais nunca tinha ouvido falar. Sinto-me deveras ignorante, mas o que se há de fazer além de comemorar a capacidade de maravilhamento que ainda me resta, não é mesmo?
Vejam isso. É a obra da artista Nikki de Saint Phalle. Um jardim com esculturas gigantes que representam as 22 cartas do tarô. Algumas são negras gorduchas, as "Nanas", que também existem sempre em tamanhos enormes em várias partes do mundo.
A artista é francesa e viveu nos Estados Unidos, o Jardim do Tarô está na Toscana. Antes de começar esse Jardim todo colorido e feliz, ela ficou conhecida por seus happenings de tiro. Fazia quadros e esculturas e depois atirava neles. Eu me encantei pelas Nanas e pelo Jardim. A maior, que representa a Imperatriz, era a casa dela. Um dia quero visitar esse lugar...

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

História circular

A história que a gente estudou na escola mudou. A história da América Latina, a gente nem estudou. Ontem descobri que houve um momento em que a Argentina tinha uma quantidade enorme de negros. Hoje não se vê um. Mataram todos. Esse é um capítulo sobre o qual ninguém fala, que ainda precisa ser reescrito.
A história da arte, porém, já está sendo. O que aconteceu a Camille Claudel não foi uma exceção, mas parece ter sido regra. A quantidade de mulheres artistas ao longo do tempo não é tão pequena quanto aprendemos. Muitas fizeram coisas, mas foram assinadas por pais, irmãos, maridos.
Comprei um livro de reportagens do Eduardo Galleano. Só ouvimos falar das "Veias abertas da América Latina", mas depois descobri os pequenos textos poéticos, lindos, de "O livro dos abraços". Ele poetiza a mitologia pré-colombiana em outro livro, e também episódios históricos. Está tudo girando em torno de histórias, lembranças fortes da minha ida ao Chile, estou reescrevendo minha história ideológica e construindo novos referenciais, menos polarizados, mais pós-modernos, mais latino-americanos.
Eu bem podia ter dez anos mais quando fiz faculdade, devia ter me jogado por aí, ou não, nada disso faria sentido, talvez...

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Lições de vida

É um lugar muito peculiar esse delta do Tigre. Fomos de trem, um trem de passageiros desses que a gente nunca usa em São Paulo. Encontramos um amigo local em uma estação no meio do caminho e chegamos à cidade de Tigre. A viagem não leva nem uma hora.
A cidadezinha é a porta de entrada para várias atrações populares - parque de diversões, feirinha de artesanato, praias fluviais - então é bastante muvucado. Mas como o Guille conhece o local, tomamos um táxi-lancha até uma das dezenas (ou centenas?) de ilhotas que formam o delta. É uma paisagem inusitada. De cada braço maior de rio saem vários outros riozinhos. E em cada um deles, uma casa depois da outra, em terrenos grandes e acesso apenas pelo rio. Só se chega de barco. A maioria são casas de veraneio, mas também há gente que mora, claro. A sorveteria é móvel, assim como o mercadinho e o vendedor de gás.
Descemos em uma ilhota chamada Trés Bocas, que tem uma ótima parrilla. Bem em frente ao restaurante, há um posto de gasolina. Depois de nos fartarmos de carne ótima, sentamos em umas espreguiçadeiras de frente para o posto. Todo tipo de barco vinha abastecer, de jet skis invocados até canoas motorizadas. Locais também se movimentam para todo lado com barcos a remo, que resultam em pele tostada de sol e muques consideráveis. Para homens e mulheres.
Comemos um bife de chorizo muito bom e experimentamos o vacío que o Guille pediu. É uma carne mais fibrosa, parece lagarto, mas na hora me veio à cabeça cupim. Fui explicar para ele que era a corcova do boi e ele ficou indignado: "Os bois aqui não têm corcova!"
Ahnn? Como assim?
Ainda bem que minha irmã entende mais de pecuária do que eu, e me explicou que o boi no Brasil é zebu e aqui é angus aberdeen, o que explica porque a carne aqui é tão boa. Vivendo e aprendendo...

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Não é pedir demais

Um pouco de falta de rotina não só me faz muito bem. É simplesmente tudo nessa vida. Não que eu consiga viver la vida loca. Durmo cedo, meia noite, uma hora. Acordo cedo, oito no más. Tomo café, almoço, lanchinho, janto. Vou aos dois cursos. Mas não estou sentada o dia todo na mesma bat-cadeira. Uma hora estou na cozinha, na outra no sofá. Bem, são apenas 30 metros quadrados, logo também não há tanta opção.
Mas dou uma saidinha aqui, outra ali. Vou almoçar no bar da esquina, depois compro um pãozinho no restaurante de orgânicos e troco dois dedos de prosa com a dona, que é casada com um dos produtores do CQC e portanto mora mezzo São Paulo, mezzo Buenos Aires.
Levo a roupa à lavanderia. Compro um pouco de queijo e um tomate no mercadinho aqui em frente, quase um empório que tem de um tudo. Posso ir lá a qualquer momento, fica aberto até as 22h, então decido a cada dia o que vou comer, compro o que falta, e faço.
Hoje saiu omelete com presunto, queijo e tomate e uma taça de vinho rosê. Confesso que comprei o que tinha tampa de rosca, porque aqui não tem saca-rolha, e só no caixa descobri que custava só 15 pesos. Ou seja, 5 real. Amanhã poderei constatar com mais acurácia a qualidade do dito cujo, mas por enquanto está me parecendo bem razoável...
Nunca quis ser frila. Nunca achei que conseguisse produzir alguma coisa se não me impusesse uma rotina rígida. Com isso, passei anos trabalhando 12 horas por dia, sem saber o que fazer quando tinha um pouco de tempo livre.
Cansei.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Envelhecer em paz

Minha querida hermanita está por aqui e ontem à noite fomos assistir um espetáculo lindo, sobre as mulheres de García Lorca. Uma cantora, de uns 25 anos, de voz potente, e também bailarina de flamenco, e dois músicos, um violonista e um percussionista. A moça é realmente um show, em um cenário mínimo, com figurinos lindos. Valeu muito.
Achei curioso que o espaço artístico era bem alternativo, com arquibancadas de madeira e até almofadas no chão. E a maioria do público era bem maduro, digamos. Pessoas acima dos 60 anos.
Claro, era um espetáculo de cultura tradicional espanhola, talvez não interesse muito à galera jovem. Mas o que gosto aqui em Buenos Aires é que as pessoas de todas as idades saem para fazer seus programas.
Das últimas vezes que vim, sempre acabei em espetáculos lindíssimos, cercada de pessoas de cabelos brancos. Acho que é mais fácil envelhecer por aqui...

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Dieta mediterrânea

Salve a imigração italiana na América Latina! Salve a dieta mediterrânea que une São Paulo a Buenos Aires. A comida daqui é exatamente a comida da minha avó. Sempre uma verdura escura cozida, uma saladinha, carne e um carboidrato. Um dia purê, no outro polenta. Nem sempre arroz e feijão. Muita variedade e muitas opções sem fritura, sem cremes, sem frescura. Claro, também é a terra do bife à milanesa com batatas fritas, mas eu passei longe até agora.
Minha primeira refeição feita em casa não foi digna de nota. Além de ter comprado um nhoque pronto no mercado, uma verdadeira heresia para quem já comeu o nhoque da minha avó, ainda estava muito de pé atrás com a cozinha (mínima) e as panelas (encardidas).
Até que vi a frigideira do Oliver, totalmente grudada que nem a daqui. Dei um trampo na parte de dentro, arranquei todo o grude, e começaram a sair coisas melhores.
Um macarrão com atum, abobrinha e almeirão que ficou, modéstia a parte, divino. Hoje saiu polenta com carne moída. Fora de casa, ótimas saladas. Domingo, pedi carne pela primeira vez, "colita de cuadril". Não sei que corte é esse, mas tinha uma gordurinha parecida com a de picanha que achei sensacional.
Só sinto falta dos sucos de fruta. Não sou a pessoa mais fã de frutas do mundo, mas não gosto de refrigerante. Estou comendo pêssegos deliciosos, mas o suco custa o dobro de um refrigerante e quase não tem variedade. Custa até mais caro do que uma taça de vinho... Que acaba sendo uma opção melhor, digamos. Afinal, não deixa de ser fruta, não é?

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Las histericas somos el máximo!*

39 mulheres, 1 bendito fruto. Em uma sala quadrada, pequena, rodeada de livros, um tema polêmico: heroínas da história da arte. Mulheres artistas, feministas, femininas. Quando vi o título da série de palestras no Malba, não resisti. Lá se foram 200 pesos (75 reais, quase nada) para as quatro primeiras aulas.
Oras, mas se não for para alimentar minha própria alma por que teria alimentado os corpos de tantos amigos com sopas nos últimos dois anos?
Ano passado nem conta muito, mas guardei tudo o que ganhei vendendo sopas em 2009 para uma viagem, que se tornou esta viagem.
Acabei de comer uma salada deliciosa saindo do Malba e tomei uma taça de chardonnay para ver se consigo dormir esta noite.
Por que fui escolher estudar à noite?
Ontem saí do curso de roteiro às 10 e meia e não consegui pegar no sono até umas duas, a cabeça a mil.
Antes de vir estava com uma série de sintomas esdrúxulos e no final, sem conseguir comprovar nada pelos exames normais, minha médica me receitou férias.
Bom, minhas férias são assim.
Já li dois livros, comecei o terceiro. Estou fazendo dois cursos. Fui a dois museus, um cinema.
Corpo?
Estou andando horrores, coisa que adoro. E comendo bem.
Não exatamente light, mas sem abusos. Por falar em comida, minha dieta mediterrânea vem no post seguinte.

* Esse título é o primeiro verso de uma música de uma cantora e pianista chamada Liliana Felipe, que descobri hoje no curso. Uma música divertidíssima, que fala de Freud, Lacan, cunilingus e ponto G. Porteña, ¡no más!

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Passeio dominical

Eu e as fotos realmente não nos damos muito bem. Além de morrer de preguiça de ficar carregando a câmera e fotografando, minha câmera é lamentável. É uma Pentax digital com um display tão tosco que o resultado das fotos é quase tão surpreendente quanto as que saíam da minha K1000 analógica e manual. Mas ontem estava um domingo lindo de sol, e fui conhecer o Rosedal, ou seja, o roseiral que fica no parque Três de Fevereiro. São muitos canteiros de rosas de todas as cores, formando caminhos e composições interessantes. Aí não teve jeito, tive que tirar umas fotinhos.
Dentro do parque também tem o Museu Eduardo Sívori, que estava apresentando uma mostra de ilustrações e gravuras feitas para capas de livros. Havia obras de alguns dos maiores ilustradores argentinos e trabalhos incríveis.
Mas gostei mesmo da exposição de pequenas esculturas de uma artista chamada Laura Nucenovich. São pequenas imagens de metal, com formas tão expressivas. Consegui fotografar uma delas, que se chama "Eu sou meu pior inimigo". São tão lindas... No site da artista aparecem as imagens. Mas a exposição ao vivo, em um jardim no fundo do Museu, ao ar livre, é muito melhor...

Por isso uma força

Meia quadra. É exatamente essa a distância que separa meu apartamento de um projeto social que tem tudo a ver com um trabalho que estou tentando fazer em São Paulo e não consigo colocar em prática.
No primeiro dia, quando saí para explorar os arredores, vi o corredor comprido, com uma grade de ferro e paredes grafitadas. Cara de projeto social. Na hora quis saber o que era, mas como sei que minha curiosidade acaba sempre me metendo em enrascadas, fingi que não vi.
No sábado, fui comprar o jornal e, do lado da entrada, havia um mercado público com bancas de artesanato e alimentos orgânicos, resultado de projetos sociais no interior. Dei uma olhada geral, ainda estava abrindo, e caí fora antes de ser recrutada para alguma coisa.
Mas não adianta fugir, não é mesmo?
Logo que abri o caderno de sábado do Clarín, bati o olho na notícia da estreia de um documentário sobre a gravação acústica do CD da banda “Las pastillas del abuelo”. O que me chamou a atenção foi que o documentário também falaria sobre a produção da capa do CD, feita pelas mulheres do grupo Yo No Fui, um projeto social com presidiárias, que trabalha com serigrafia.
Fiquei meio de bode porque a máquina engoliu meu cartão ontem pela manhã, então resolvi ficar na minha e até trabalhei um pouco no sabadão à noite. A TV a cabo tem uma infinidade de canais, vi um filminho, depois American Idol que está divertidíssimo com JLo e Steven Tyler como jurados.
Descobri que o documentário ia passar hoje de novo no Malba, que não é muito longe daqui, e me organizei para ir.
Por Dios!
A banda é incrível, ótima música, já virei fã. E o projeto... tem tudo a ver. Muito mais do que artesanato e serigrafia, o Yo No Fui começou com poesia, que é o que estou tentando desenvolver em São Paulo.
Ano passado participei durante uma tarde do projeto de música e dança que minha amiga Monica Jurado desenvolve com um grupo de mulheres em um presídio na Zona Norte. Foi um dos momentos mais emocionantes que já vivi. São mulheres do mundo todo, cada uma fala uma língua, mas os problemas são os mesmos. E todas cantam e dançam juntas, e assim soltam seus demônios. Muitas foram presas por tráfico de drogas e isso talvez explique porque tantas são ótimas cantoras. Muita gente ligada ao mundo das artes que vacilou. E desde então quero participar e pensamos em desenvolver alguma coisa com poesia, mas não consigo dar uma forma à ideia, fico andando em círculos.
Amanhã vou lá. Espero que isso seja uma força centrípeta que me jogue para fora desse círculo infinito.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Ah, sim, claro, o curso

Começou! E parece que vai ser muito bom.
São quase dez pessoas, todos coleguinhas engajados. Alguns estudantes de cinema, um compositor de trilhas, um crítico, uma moça que também trabalha com texto.
A professora, Michelina Oviedo, é psicóloga e fez Escola de Cuba há 20 anos, o que para mim são ótimas referências. Primeiro, porque só consegui realmente entrar na criação literária depois que entendi a visão de linguagem da psicologia. Não que a Jeanne Marie não tivesse tentado me ensinar isso na faculdade, mas naquela época eu simplesmente era piba demais para ter noção das coisas. E segundo porque fazer Escola de Cuba há 20 anos significava ter aulas com Fernando Birri e García Márquez. Apenas.
Claro que isso significa um pé no esquerdismo, mas a visão dela é a de que cinema é uma arte feita para as massas, com uma estrutura bem definida. O que distingue uma boa cinematografia de outra é a premissa, porque a dramaturgia é milenar e culminou em Shakespeare. O resto todo veio daí.
Nosso primeiro exercício é assistir um filme e "desroteirizá-lo", ou seja, escrever o roteiro de forma literária. O grande diferencial, ao que me parece, é que a Michelina acredita que o texto deve trazer as imagens necessárias para que o diretor possa saber onde colocar a câmera e o produtor saiba fazer o orçamento (simplificando bem, é claro). Então não podemos fazer indicações de plano e posição de câmera, só contar a história de uma maneira visual.
Os exemplos que ela deu (de um roteiro do García Máquez, por exemplo) falam por si. Tudo se encaixa no que venho discutindo nos últimos anos com as muitas psicólogas queridas que passaram a fazer parte da minha vida e que agora queremos transmitir no nosso coaching literário.

Adaptação

As camadas ainda se acomodam.
Uma hora consigo uma conexão de internet, na outra não rola de modo algum. Tentei comprar um modem, o caixa eletrônico engoliu meu cartão. Tudo se resolveu sem grandes prejuízos, mas não consegui tirar o dinheiro e perdi o cartão, que precisou ser cancelado.
Enfim... Nunca tinha tido que lidar com esse tipo de coisa em viagem, coisa de quem vai passar um período mais longo do que uma semana no mesmo lugar.
Mas o legal é justamente andar pela cidade atrás de coisas que só os locais procuram. Ontem passei o dia no Centro. A princípio, tomei o ônibus aqui perto para ir a determinada esquina da Avenida Corrientes onde há lojas de DVDs para cinéfilos. Precisava comprar o filme que escolhi para meus exercícios, "Onde vivem os monstros". Eu já queria comprar e claro que saiu mais barato do que no Brasil.
Claro que também não resisti e comprei "Shortbus" e uma coletânea de animações do Norman McLaren, que adoro. Tive uma VHS copiada de uma coletânea muito obscura, que usei para fazer um trabalho na faculdade de design. Mas emprestei para alguém que jamais me devolveu. Agora eu tenho de novo, com 32 curtinhas!
Depois de andar as 11h da manhã até as 4h da tarde, parando muito rapidamente para almoçar, fui ao cinema. Assisti um filme francês chamado "La Mentira" (em espanhol). O Gerard Depardieu faz uma ponta, mas é só um charme mesmo (não ele, que está enorme de gordo). O filme é seco, o protagonista é lacônico, mas está tudo dito. Ele é um golpista que resolve roubar o chefe (Depardieu) e se mandar. Chega a uma cidade e se faz passar pelo encarregado da construção de uma autoestrada, que deveria ter sido construída mas que foi embargada por um grupo de ecologistas. Com isso, a cidadezinha praticamente faliu, então todos ficam exultantes diante da possibilidade de a obra recomeçar.
A princípio, o picareta quer passar a perna em todo mundo. Mas quando consegue mobilizar a cidade e se vê prestigiado, ao mesmo tempo em que pela primeira vez está construindo (literalmente) alguma coisa, ele acaba se envolvendo com as pessoas.
O filme é baseado em uma história real. Deixa você em suspenso, querendo saber como é que ele vai se safar dessa...

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Odores e ruídos

Quando chego a um lugar estranho, sempre reparo nos cheiros. Claro, quando são bons não presto muita atenção, mas se são ruins me incomodam bastante. O apartamento que aluguei por aqui é bonitinho, mas estava bem sujo. Assim que entrei, senti o cheiro de cigarro. Alguém passou um bom tempo fumando Oliú na cama. Alguém deixou uma cerveja estourar na geladeira. Alguém deixou os panos de chão sujos e molhados dentro do armário embaixo da pia.
Não sou a Dona Neura, mas sou filha dela. Ontem estava cansada demais, mas hoje fiz uma bela faxina na cozinha e no banheiro. O cheiro de cigarro melhorou bem com o Gleide. Lá se foram vários pesos em produtos de limpeza. Mas valeu o investimento: está tudo bem mais habitável.
Os ruídos são até engraçados. Ao longe ouço passar o trem. Não incomoda, é até bucólico. Mas ontem à noite ouvia um barulhão, fiquei em dúvida se era uma obra ou uma batucada. O vento levava e trazia o ruído, que aos poucos ficou mais próximo. Sim, era uma batucada pré-carnavalesca em pleno bairro de Palermo. Sim, a escola de samba porteña parecia mais uma britadeira no asfalto.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Sono arrivata a Buenos Aires

Tudo indica que minha vida monástica paulistana, almoçando 12h30 e jantando com as galinhas está com seus minutos contados. Depois de um dia cansativo de viagem, com direito a almoço no McDonald's do aeroporto, resolvi sair para jantar às 20h. Um restaurante aqui do lado me informou que, infelizmente, ainda não estavam abertos para o jantar. Outro, bem aqui em frente, disse que sim, estavam abertos. O garçom batia papo na calçada, mas logo veio me atender. Fiquei sozinha no restaurante, sem nenhum outro cliente, o tempo todo até terminar de comer.
O estrago foi grande. Fui logo encontrar um restaurante especializado em bife a milanesa atravessando a rua. E os jornais de hoje diziam que o preço do tomate e da alface estão pela hora da morte. Puxa, vou ter que comer tanta carne...
Na verdade, também não está muito animador cozinhar no apartamento. Como eu imaginava, na verdade, a cozinha é um tanto sofrível. Tem três panelinhas de chorar. Mas isso não vai desanimar uma pessoa que preparou estrogonofe para 15 pessoas em uma república de meninos no primeiro ano da faculdade. Não! Já comprei um pacote de macarrão, uma lata de atum, pão, manteiga, iogurte light. Os pêssegos estavam lindos e dois saíram por menos de R$ 1.
A viagem atrasou um pouco, mas as malas (quase paguei excesso, apesar de ter cabido tudo dentro do armarinho de duas portas do apê) chegaram. O apartamentinho que aluguei é bem mais velhinho do que mostram as fotos do site (lógico) e tem um defeito grave: cheira a cigarro. Comprei um Gleide que já está mostrando a que veio. Ou é o meu nariz que está se acostumando...

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Brasilidades

Ir ao cartório representa um sofrimento inenarrável para mim. Enfrentar aquela burocracia é algo excruciante. Penso que o Brasil está melhorando, e daí me lembro dos cartórios e quero chorar. Acho que só podemos pensar em algum avanço real (especialmente de mentalidade) no dia que essa instituição, aliada inseparável da burocracia, for extinta.
Às vésperas de viajar, precisei fazer uma procuração pública para deixar para o contador. Custa a módica quantia de R$ 142 e uns quebrados. Segundo consta, desde o escândalo com a quebra do sigilo bancário da filha do Serra, o governo resolveu complicar a vida de quem pede informações para a Receita Federal. Antes você mandava seu contador lá com uma procuração feita em casa e tudo bem.
Agora, tem de ir ao cartório, sentar na frente da escrevente e criar com ela um lindo texto cheio de salamalaques linguísticos para então seu contador ir na Receita e dizer: olha, vocês estão dizendo que a gente não pagou, mas pagou.
Pior é que isso também é necessário para quem sabe que não pagou e quer pagar. O dono da empresa manda o contador lá dizendo: devo, não nego, pago já. Não adianta. Jamais haveria um benemérito capaz de se oferecer para ir até a Receita, ficar na fila e saldar suas dívidas fingindo que é você. Mas o pessoal da Receita acredita em Papai Noel, então benemerência só com procuração pública.

sábado, 22 de janeiro de 2011

Ouço a ficha caindo

Faltam dez dias. El 1er de febrero me voy a Buenos Aires, por um mês, fazer um curso de roteiro e explorar a cidade de cima abaixo. Só agora comecei a procurar os lugares que já fui e que quero rever. Fiquei emocionada. Amo Buenos Aires, amo a cultura argentina, a música, os quadrinhos, o humor agridoce parecido com o nosso e com o italiano.
Vi o site da livraria Clásica y Moderna, onde em 2009 assisti um espetáculo sobre Borges que me deixou sem fala. É livraria, mas tem restaurante e shows intimistas de música, poesia e literatura. Há museus novos abrindo, uma programação intensa de verão.
Já estou começando a arrumar as coisas, tirando o mofo da mala, separando as roupas. A única vez que viajei durante um mês foi em 1991, quando fui para a casa da Olga, uma colega chilena de faculdade, em Santiago. Naquela época, o Chile tinha saído da ditadura havia pouco mais de um ano. As pessoas não saíam à noite, ainda estavam se acostumando com a falta do toque de recolher.
Viajamos para o litoral e o sul, paisagens lindíssimas, lagos, vulcões, o Pacífico congelante mesmo no auge do verão. Pouca gente que eu conhecia tinha ido para o Chile a passeio. Hoje, é um dos países mais admiráveis do continente e um dos mais procurados para turismo.
Nossa imagem dos países da América Latina era muito diferente. No auge do nosso espírito esquerdista, na faculdade, procurávamos nossa raiz comum, uma cultura, uma ideologia. A maioria das pessoas, porém, ainda tinha preconceito e desdenhava dos vizinhos, generalizando todos os países em uma massa amorfa de nativos de Ciudad del Leste.
Para mim, essa imagem mudou totalmente. A América Latina ainda não é um primor de democracia, as notícias ainda fazem a gente rir, balançar a cabeça e dizer: "Só na América Latina pra acontecer uma coisa dessas", mas cada país adquiriu uma identidade própria. Na verdade, já tinham, é claro, mas só agora é que começamos a perceber.
O Peru está explorando com maestria sua diversidade gastronômica, com experimentações à base de ingredientes únicos (eles têm centenas de tipos de milho, cor de púrpura, preto, com grãos enormes, um mais diferente do que o outro, pimentas de todas as picâncias, batatas...) e uma influência cultural de diversos países, como China e Japão. Também estão explorando o turismo e a origem inca, em museus e sítios arqueológicos. Sem contar que eles têm litoral, cordilheira, selva, deserto e uma gama de hábitats maior do que o Brasil.
A Colômbia é outro lugar que aprendeu a extrair o que de melhor havia em sua cultura, conseguiu controlar a questão do tráfico e me parece fascinante em sua diversidade geográfica também.
São só alguns exemplos, e se quisermos encontrar defeitos também encontraremos aos montes, mas acho que o que mudou foi a maneira como esses próprios países começaram a se enxergar. Isso também vale para o Brasil. Parece que estamos conseguindo superar nosso complexo de vira-lata — isso sim uma característica comum a toda a nossa América Latina — e desenvolver um pouquinho de autoestima.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Cara nova, serviço novo

Mudei a cara do blog, uma coisa mais coloridinha, mas vivinha, apesar de eu continuar engasgando com uns golinhos de água.
Importante, porém, é o blog do novo serviço que estou prestando com Adriana de Oliveira e Silva, minha amiga: http://coachingliterario.wordpress.com

Vai lá!

Ai, que preguiça

É assim que a gente fica depois de trabalhar tanto, parecendo um verdadeiro Macunaíma, um estereótipo de baiano. E com isso não saem posts e o blog embolora como as paredes atrás da minha estante.
Enfim, os leitores devem ter debandado, mas como já tenho um blog é aqui mesmo que vou escrever minhas impressões sobre a viagem que farei semana que vem a Buenos Aires, com direito a um curso de roteiro.
Não vejo a hora!