sábado, 22 de janeiro de 2011

Ouço a ficha caindo

Faltam dez dias. El 1er de febrero me voy a Buenos Aires, por um mês, fazer um curso de roteiro e explorar a cidade de cima abaixo. Só agora comecei a procurar os lugares que já fui e que quero rever. Fiquei emocionada. Amo Buenos Aires, amo a cultura argentina, a música, os quadrinhos, o humor agridoce parecido com o nosso e com o italiano.
Vi o site da livraria Clásica y Moderna, onde em 2009 assisti um espetáculo sobre Borges que me deixou sem fala. É livraria, mas tem restaurante e shows intimistas de música, poesia e literatura. Há museus novos abrindo, uma programação intensa de verão.
Já estou começando a arrumar as coisas, tirando o mofo da mala, separando as roupas. A única vez que viajei durante um mês foi em 1991, quando fui para a casa da Olga, uma colega chilena de faculdade, em Santiago. Naquela época, o Chile tinha saído da ditadura havia pouco mais de um ano. As pessoas não saíam à noite, ainda estavam se acostumando com a falta do toque de recolher.
Viajamos para o litoral e o sul, paisagens lindíssimas, lagos, vulcões, o Pacífico congelante mesmo no auge do verão. Pouca gente que eu conhecia tinha ido para o Chile a passeio. Hoje, é um dos países mais admiráveis do continente e um dos mais procurados para turismo.
Nossa imagem dos países da América Latina era muito diferente. No auge do nosso espírito esquerdista, na faculdade, procurávamos nossa raiz comum, uma cultura, uma ideologia. A maioria das pessoas, porém, ainda tinha preconceito e desdenhava dos vizinhos, generalizando todos os países em uma massa amorfa de nativos de Ciudad del Leste.
Para mim, essa imagem mudou totalmente. A América Latina ainda não é um primor de democracia, as notícias ainda fazem a gente rir, balançar a cabeça e dizer: "Só na América Latina pra acontecer uma coisa dessas", mas cada país adquiriu uma identidade própria. Na verdade, já tinham, é claro, mas só agora é que começamos a perceber.
O Peru está explorando com maestria sua diversidade gastronômica, com experimentações à base de ingredientes únicos (eles têm centenas de tipos de milho, cor de púrpura, preto, com grãos enormes, um mais diferente do que o outro, pimentas de todas as picâncias, batatas...) e uma influência cultural de diversos países, como China e Japão. Também estão explorando o turismo e a origem inca, em museus e sítios arqueológicos. Sem contar que eles têm litoral, cordilheira, selva, deserto e uma gama de hábitats maior do que o Brasil.
A Colômbia é outro lugar que aprendeu a extrair o que de melhor havia em sua cultura, conseguiu controlar a questão do tráfico e me parece fascinante em sua diversidade geográfica também.
São só alguns exemplos, e se quisermos encontrar defeitos também encontraremos aos montes, mas acho que o que mudou foi a maneira como esses próprios países começaram a se enxergar. Isso também vale para o Brasil. Parece que estamos conseguindo superar nosso complexo de vira-lata — isso sim uma característica comum a toda a nossa América Latina — e desenvolver um pouquinho de autoestima.

Um comentário:

Fabiana Oliveira disse...

Lizandra,
Morando fora do Brasil, conseguimos perceber essa falta de autoestima do povo, de achar que tudo que vem de fora é melhor que o nosso, ledo engano! Cá meus olhos abriam para um mar desconhecido, e a cada dia amo e amo meu BRASIL, mesmo com seus defeitos,temos que acreditar, desistir jamais!