Outro dia um amigo me perguntou se eu, que tenho tantos amigos cineastas, não tenho vontade de fazer um filme. Não tenho não.
Ficção não rola. Nunca tive amigos imaginários. Quando começo a pensar num personagem, só consigo me lembrar de histórias reais. Tem umas tão boas que parece que nada que possa sair da minha imaginação vá fazer frente. Também acho que vou acabar sendo meio maniqueísta, careta. Não, não rola.
Já no caso do documentário, o drama é outro. Pensa bem. É você, uma câmera, e a vida de uma pessoa, ou de várias. É uma intimidade enorme. A câmera vê além do olho. A câmera tem zoom. A câmera não tem contato visual.
Uma entrevista já é um exercício de humanidade, de entrega. Tenho a impressão de que se eu não falasse de mim, também não ouviria muito. É uma troca. Com uma câmera no meio, cadê?
Assisti três documentários suecos feitos por alunos, na seqüência. Um é um pouco barroco, mas o entrevistado é o roteirista Tonino Guerra, que participou da concepção do filme. Ele não conta toda a vida, só conta de sua paixão por pincéis usados, o que rende lindas histórias. A liguagem é careta, mas o diálogo é pleno.
Outro tem um personagem interessantíssimo, mas o filme não flui. E não flui porque a entrevista não chega lá. Mas o interesse persiste, então dá pra assistir. O terceiro é um exemplar do que mais me incomoda em documentários: a visão do estrangeiro sobre o exótico terceiro-mundista. É o formato que mais fascina. Mas a falta de compreensão do outro fica sempre por um fio. A câmera invade.
As pessoas assistem Big Brother. Eu não consigo. Não posso correr esse risco. Não, acho que não vou fazer filmes.
* A expressão é da minha professora de redação jornalística, Cremilda Medina, que escreveu um livrinho chamado "Entrevista, o diálogo possível".
Nenhum comentário:
Postar um comentário