Quando ele chegou em casa o alarme tinha acabado de disparar. Era uma sirene forte, muito próxima. Podia ser do mercado ou do prédio em construção. Talvez do centro espírita. Mas tem alarme nesses lugares?
O som pára.
Entra em casa e vê a mulher largada no sofá, alerta, em frente à TV. Que estranho esse alarme, né? Agora que começou? Faz uns cinco minutos. O ruído volta. Começa assobiando e vai ganhando corpo até a estridência histérica que remete a uma tragédia brutal.
Foram encontrados cinco corpos carbonizados em um misterioso incêndio na loja dos supermercados Pão de Açúcar da Rua Apiacás, no bairro de Vila Pompéia. As vítimas ainda não foram identificadas.
Um intervalo de novo. Alguém grita um feladaputa de torcida de futebol. A mulher ri. Ó, o louco. Vai xingar o alarme? O som não pára mais. Diminui, parece que recobra o fôlego e volta. De novo. Vou lá fora ver. Ver o quê? Não tá ouvindo? Disparou um alarme. É, mas precisa ver de onde é, se é de incêndio. Senão a gente não sabe se liga pra polícia ou pros bombeiros. O barulho cede, a gata estremece, parva de medo. Os vizinhos estão todos na calçada, de roupão, chinelo. Vou lá fora. Pra quê? Já passa. O marido sai, a mulher se ajeita no sofá com a gata, que se eriça toda quando o barulho retorna, agudinho de novo. No fundo, o burburinho dos vizinhos, uma movimentação de carros. Ela abaixa o volume da TV, que já não se ouvia. A sirene então cessa e dá lugar ao silêncio absoluto. Ela sorve a surdez repentina, com alívio. O silêncio persiste.
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